ESTADO DO CEARÁ
História do Ceará
O povo cearense foi formado pela miscigenação de colonizadores europeus, indígenas catequizados e aculturados após longa resistência e negros que viviam como trabalhadores livres ou escravos[9]. O povoamento do território tem sido bastante influenciado pelo fenômeno natural da seca.
Era uma sociedade rural baseada sobretudo na pecuária, principalmente no sertão, e na agricultura, em especial nas serras e vales. A elite latifundiária, mediante o poder econômico e complexas relações de parentesco e afilhadagem, possuía controle de quase todos os aspectos da vida social. Os "coronéis" mantinham em suas propriedades muitos dependentes que lhes prestavam serviços ou entregavam parte de sua produção em troca da posse de um lote de terra, além de trabalhadores assalariados.
O desenvolvimento independente do Ceará começaria apenas depois de sua desagregação de Pernambuco em 1799[10], e sua história é marcada por lutas políticas e movimentos armados. Essa instabilidade se prolongou durante o Império e a Primeira República, normalizando-se depois da reconstitucionalização do País em 1945.
Ceará Pré-Colonial
Existem relatos de que os navegadores espanhóis Vicente Yáñez Pinzón e Diego de Lepe desembarcaram na costa cearense antes da viagem de Pedro Álvares Cabral ao Brasil[11]. A de Pinzón chegou a um cabo identificado como "Porto Formoso", que se acredita ser o Mucuripe, e Lepe, à barra do rio Ceará, em Fortaleza. Essas descobertas não puderam ser oficializadas devido ao Tratado de Tordesilhas (1494).
As terras equivalentes à Capitania do Ceará foram doadas a Antônio Cardoso de Barros, que, porém, não se interessou em colonizá-las[12]. Ficaram assim entregues à ação de corsários, notadamente franceses, que em 1590 estabeleceram a Feitoria da Ibiapaba, para explorar o mbar-gris, as madeiras de lei, a pimenta e o algodão nativo. Os esforços de povoamento pelos portugueses visavam principalmente a vencer a resistência indígena e garantir o domínio luso contra estrangeiros.
O Ceará era habitado ancestralmente por indígenas dos troncos Tupi e Jê, cujas tribos ainda hoje denominam vários topônimos no Ceará[13]. Os colonizadores portugueses chegaram em 1603 através do litoral, mas o povoamento pelos europeus foi bastante dificultado nas primeiras décadas de colonização, devido à intensa resistência dos nativos - que destruíram o primeiro forte edificado para marcar o domínio português e mataram muitos dos primeiros povoadores -, à interveniência de secas e às incursões de piratas estrangeiros.
Ceará Colonial
Ceará a partir do mapa de 1629 por Albernaz I.A primeira tentativa efetiva de colonização ocorre com Pero Coelho de Sousa em 1603, que funda o Forte de São Tiago na Barra do Ceará. Em 1605, porém, sobrevém a primeira seca registrada na história cearense, fazendo perecer Pero Coelho e sua família. Em 1612 nova expedição é enviada como parte dos esforços de reconquista do Maranhão, sob o comando de Martim Soares Moreno, que funda o Fortim de São Sebastião também na Barra do Ceará. Voltando apenas em 1621, encontra o forte destruído, mas lança as bases para o início da exploração econômica e o apaziguamento dos nativos[14].
Em 1637 o terreno é tomado pelos holandeses, que constroem, na embocadura do riacho Pajeú, o Forte Schoonenborch e procuram se estabelecer na região sob forte hostilidade dos indígenas. Após a sua expulsão em Pernambuco, entregam o forte aos portugueses, que, dessa vez contando com o apoio dos nativos, restabelecem o poderio português, rebatizando-o de Fortaleza de Nossa Senhora da Assunção[15]. Os portugueses continuaram a colonização do território cearense com intuito de protegê-lo de invasões de estrangeiros[14].
A influência dos jesuítas foi determinante, resultando na criação de aldeamentos (Porangaba, Paupina, Viçosa e outros), muitos deles fortemente militarizados, onde os indígenas eram concentrados para serem catequizados e assimilados à cultura lusitana. Tribos tupis aliadas dos portugueses também vieram se instalar em vilas militarizadas na capitania. Dessas reduções surgiram as primeiras cidades da capitania, como Aquiraz e Crato. O processo de aculturação, no entanto, não se deu sem grandes influências de crenças e produtos nativos. A intensa resistência levou a episódios sangrentos, destacando-se a Guerra dos Bárbaros, ao longo de várias décadas do século XVIII, que resultou na fuga dos habitantes da capital Aquiraz, em 1726, para Fortaleza, que passou a ser a capital[16].
Primeiro mapa de Fortaleza de 1730.Outras frentes colonizadoras surgiram com a instalação da pecuária na capitania, através dos Sertões de Dentro e Sertões de Fora, levas oriundas respectivamente da Bahia e de Pernambuco[17]. Vilas como Icó, Aracati, Sobral e outras surgiram do encontro de rotas do gado tangerino, que era levado até as feiras ou fregueses. Mais tarde o custoso transporte do gado perdeu importncia para a produção da carne de charque que, no final do século XVIII, se disseminou também para a Região Sul do Brasil. Nas regiões serranas, houve grande afluxo de pessoas que se dedicaram à agricultura policultora, o que veio a caracterizá-las pela maior diversificação da produção e pela estrutura menos latifundiária que a do sertão. O vale do Cariri assenta-se menos na pecuária e mais na cultura da cana-de-açúcar, propiciando a entrada de maiores levas de escravos africanos. O litoral, refúgio de muitos indígenas e negros livres ou fugitivos, povoou-se de vários vilarejos de pescadores.
As principais vilas da capitania da época charqueana eram Aracati, Crato, Icó, e Sobral. A que mais ganhou destaque foi Aracati, devido ao comércio de couro e carne de charque. Entre os anos de 1750 a 1800, Aracati viveu seu apogeu[18], mas com uma grande seca na região entre os anos de 1790 até 1793, os rebanhos bovinos morreram e a produção de charque transferiu-se para o Rio Grande do Sul, que assumiu a posição de abastecedor principal das outras regiões.
Capitania do Ceará Grande
Mapa do Ceará feito por Mariano Gregório do Amaral em 1800.Em 1799 o Ceará adquire independência em relação à Pernambuco, e Bernardo Manuel de Vasconcelos foi nomeado seu primeiro governador, sendo o responsável pelo início da urbanização de Fortaleza[10]. No final do século XVIII, especialmente com a Guerra de Independência norte-americana, o algodão vai tomando relevante papel na pauta de exportações do Ceará. Com o declínio do charque, cuja distribuição era centrada em Aracati, Fortaleza se torna a principal cidade cearense devido à sua condição de destino dos produtos agrícolas cultivados nas diversas serras que se elevam nas vizinhanças do município.
Em 1812 torna-se governador do Ceará o português Manuel Inácio de Sampaio e Pina Freire, o qual reúne os literatos no palácio do governo e dá incentivo às artes e à urbanização da capital por meio dos projetos de Silva Paulet. No começo do século XIX o Ceará passa por movimentos rebeldes, como a República do Crato, em 1813, e também influências da Revolução Pernambucana de 1817, movimentos de cunho republicano-liberal liderados pela família cratense dos Alencar. Tal movimento foi reprimido com dureza pelo governador provincial do Ceará, Inácio de Sampaio.
Ceará no Império
Imagem de um moinho de vento, em Aracati, da Comissão Científica de Exploração em 1859.Em 1825 o Ceará toma parte na Confederação do Equador, com o liberal Tristão Gonçalves aplicando um golpe e tornando-se chefe do governo. A Confederação é frustrada pela forças imperiais, e Tristão morre durante os combates contra as forças legalistas do Império. O ciclo de conflitos termina com a Insurreição de Pinto Madeira, grande "coronel" de Jardim, que visava ao retorno da monarquia absolutista e representava interesses regionais opostos aos da cidade próxima do Crato, de inspiração marcantemente liberal. A insurreição termina derrotada por forças cratenses.
Em meados de 1860, devido à Guerra de Secessão norte-americana, há um surto de crescimento da produção do algodão. Tal florescimento não dura muito tempo, mas deu grande impulso à modernização da infra-estrutura da Província. Em 1877, tem início a chamada Grande Seca de 1877-1879, um dos mais severos períodos de seca prolongada da história cearense, levando à morte milhares de pessoas e acarretando emigração maciça de retirantes. Fortaleza recebeu uma população de fugitivos da seca quatro vezes maior que a sua própria[19].
Jornal abolicionista "Libertador"[20] de 25 de março de 1884.Logo após, a produção da borracha explode na Amazônia, e muitos cearenses vítimas da seca migram para esta região[21].
A gravidade dessa estiagem chamou a atenção do governo central e mesmo de cientistas, havendo então a produção de textos científicos e propostas de melhoramento da situação da população cearense [22], cuja maior parte não foi posta em prática ou se relevou ineficaz. Por outro lado, houve um aceleramento nas obras do Açude do Cedro, em Quixadá, o primeiro do Nordeste, que só ficou pronto em 1906[23]. A Grande Seca e as estiagens seguintes impulsionaram o surgimento da indústria da seca e geraram uma tradição migratória no estado[24]. Entre 1869 e 1900, 300 mil cearenses abandonaram sua terra, 85% deles indo para a Amazônia[25].
Anos antes da proclamação da República notabilizou-se a campanha abolicionista no Ceará, que logrou abolir a escravidão no estado em 25 de março de 1884, quatro anos antes da Lei Áurea. O movimento contou com a participação de várias sociedades libertárias, inclusive a maçonaria, mas o maior destaque ficou com Francisco José do Nascimento, o Dragão do Mar, jangadeiro que impulsionou o abolicionismo ao comandar seus companheiros, em 1881, numa total recusa a transportar escravos para dentro ou fora da província[7]. A primeira cidade brasileira a abolir a escravatura foi Acarape, atual Redenção, em 1º de janeiro de 1883. Devido a isso, o Ceará recebeu a alcunha de Terra da Luz, de início por José do Patrocínio. A escravidão, que jamais fora dominante no estado, estava praticamente extinta nos anos de 1880, de forma que não houve resistência à abolição mesmo por parte da elite agrícola.
Primeira República e Estado Novo
Soldados das forças juazeirenses.No início da Primeira República, apesar das estiagens que assolaram o Ceará, Fortaleza continuou a desenvolver-se econômica e politicamente, ao contrário do resto do estado. Ocorre nas primeiras décadas do século XX um afluxo de imigrantes, embora pequeno em relação ao de outras regiões, consistindo principalmente de portugueses e sírio-libaneses.[26] Os descendentes destes, em particular, ganharam grande destaque no comércio, como mascates, e, futuramente, na política cearenses.[27]
Começou a ganhar destaque a atividade dos cangaceiros, que, agindo em grupos organizados e promovendo saques em cidades e propriedades rurais, desestabilizaram o interior do Nordeste por décadas. A forte religiosidade popular e a grande miséria estimulavam uma profusão de líderes messinicos e formas de fanatismo religioso. O cearense Antônio Conselheiro, de Quixeramobim, chegou a formar, na Bahia, o arraial de Canudos, cuja forte atração populacional e ideológica, contrária aos interesses da elite fundiária, deflagrou a Guerra de Canudos. Isso, porém, não extinguiu a influência dos líderes religiosos.
Entre 1896 e 1912, a hegemonia política foi monoliticamente concentrada nas mãos do comendador Nogueira Accioly e de sua família, que estabeleceram uma poderosa oligarquia que comandava a maior parte dos escalões do poder estadual. Em 1912, Accioly apontara como seu candidato Domingos Carneiro, contra Franco Rabelo, representante da política do salvacionismo do presidente Hermes da Fonseca, gerando uma conturbada campanha eleitoral. A dura repressão policial a uma passeata de crianças em favor de Rabelo, que causou a morte de algumas delas e feriu outras, desencadeou uma revolta de três dias da população fortalezense, forçando o governador Accioly a renunciar, evento conhecido como Sedição de Fortaleza. Franco Rabelo passou a governar o Ceará.
A Rede de Viação Cearense surgiu em 1909 e foi federalizada em 1915 para ajudar no combate a seca.No fim do século XIX o carismático Padre Cícero passou a atrair milhares de sertanejos para um pequeno distrito do Crato, que se tornaria Juazeiro do Norte em 1911, persuadidos pela sua fama de milagreiro, atribuída à suposta transformação em sangue da hóstia recebida do padre pela beata Maria de Araújo. Mesmo após à perda de sua ordenação, em virtude de controvérsias sobre o milagre, o Padre Cícero tornou-se cada vez mais conhecido e, apesar de seu caráter messinico, foi hábil em evitar grandes conflitos com a elite local, tornando-se ele próprio um poderoso chefe político. Em 1914 irrompeu a Sedição de Juazeiro, opondo o governador interventor Franco Rabelo e o Padre Cícero, que havia conquistado os postos de prefeito de Juazeiro do Norte e vice-governador. Rabelo iniciou uma perseguição ao líder religioso. Com isso, liderados por Floro Bartolomeu, os sertanejos fiéis ao Padim Ciço reuniram-se para lutar contra as tropas estaduais, conseguindo derrotá-las em sua cidade e fazê-las recuar até Fortaleza, onde, vencendo, destituíram o governador. Estabeleceu-se um relativo equilíbrio entre as oligarquias cearenses, que durou até a Revolução de 30.
Sobreviventes do Sítio Caldeirão, um dos eventos mais cruéis da história cearense.Em 1915 o Ceará sofreu com uma gravíssima seca levando a novo êxodo da população cearense para a Amazônia, região que, devido às intermitentes mas significativas emigrações, recebeu grande afluxo e influência de cearenses. A gravidade da seca inspirou a escritora Rachel de Queiroz em sua famosa obra O Quinze. O sertão sofreu mais uma estiagem em 1932, e o governo estadual não pôde dispor mais da Amazônia como refúgio para os flagelados. Diante disso, foram criados os Currais do Governo, campos de concentração para os retirantes. A instabilidade política e social foi crescendo no Estado. Nos anos 30, surgiu no Crato o movimento messinico do Caldeirão de Santa Cruz do Deserto, liderado pelo beato José Lourenço. Igualitária e agrária, a comunidade do Caldeirão perseguia a auto-suficiência, passando a ser vista pelo governo e pelos fazendeiros poderosos da região como uma má influência. Em 1937 o Caldeirão foi invadido e alvo de bombardeio aéreo, resultando no massacre de aproximadamente 400 indivíduos.
Após a Revolução de 30, o Ceará passou a ser governado por interventores do Governo Federal. Ascenderam duas organizações políticas que dominam o cenário estadual: a Legião Cearense do Trabalho, com nítida influência fascista, e a Liga Eleitoral Católica, fortemente religiosa, representante da elite tradicional e de grande apelo popular. Nos anos 40 mais uma seca (1943) assolou o Ceará, e, com a Segunda Guerra Mundial e os Acordos de Washington, o governo de Getúlio Vargas inclui o Ceará no seu projeto político. A instalação de uma base norte-americana em Fortaleza traz ideais democráticos e antifascistas que passaram a ser defendidos em várias manifestações. Sob uma forte propaganda governamental de migração (SEMTA), cerca cerca de 30 mil cearenses tornaram-se Soldados da Borracha, produzindo esse produto na Amazônia para abastecer os exércitos aliados[28].
República Nova
Vista da atual sede do Banco do Nordeste, instalado em Fortaleza em 1954.A República Nova no Ceará tem início com a nomeação sucessiva de seis interventores até as eleições de 1947, seguindo-se a eleição de Faustino de Albuquerque pela UDN. Durante seu governo, nas eleições presidenciais de 1950, o candidato udenista Eduardo Gomes obteve a maior votação, e Getúlio Vargas ficou na 3ª colocação no estado.[29] Para a direção do governo estadual é eleito Raul Barbosa. Durante seu governo houve a instalação do Banco do Nordeste do Brasil (1952) em Fortaleza. No mesmo ano o governo federal inaugurou oficialmente o Porto do Mucuripe, em cujo entorno foram instaladas várias usinas termoelétricas.
Durante a década de 1950 surgiram ou se consolidaram vários dos maiores grupos econômicos do Ceará, como Deib Otoch, J. Macêdo, M. Dias Branco, Edson Queiroz e Jereissati. Paulo Sarasate foi o terceiro governador eleito no período. Ainda nessa década tem início uma nova onda migratória para vários estados e regiões. Entre as décadas de 1950 e 1960, a população cearense passou de 5,1% para 4,5% do total da população brasileira[30]. Em 1958 foi eleito Parsifal Barroso que teve a ajuda do governo federal para combater as mazelas decorrentes da seca daquele ano, sendo a principal obra o Açude Orós, inaugurado em 1961. Em Fortaleza o Grupo Severiano Ribeiro inaugurou o Cine São Luis. Em 1962, foi criado o Banco do Estado do Ceará (BEC)[31].
Em 1963 Virgílio Távora foi eleito governador do Ceará, exercendo o mandato até 1966, mesmo com o surgimento da ditadura militar em 1964. Seu governo foi marcado pela criação do "PLAMEG I" - Plano de Metas do Governo - que visou à modernização da estrutura do estado com a ampliação do porto do Mucuripe e a transmissão da energia de Paulo Afonso para a capital. Foram criados ou instalados, também, o Distrito Industrial de Maracanaú, a CODEC e a Companhia DOCAS do Ceará. Com o AI-2, Virgílio aderiu à ARENA, e seu vice Figueiredo Correia ao MDB.
Governo militar
Vista do litoral de Fortaleza na década de 1980 vendo-se o monumento ao Interceptor ocenico.Plácido Castelo foi eleito pela Assembléia Legislativa em 1966. Durante seu governo houve perseguição política a deputados e várias manifestações, acarretando a prisão e tortura de estudantes e trabalhadores, assim como atentados a bomba em Fortaleza. Foi criado o Banco de Desenvolvimento do Ceará (BANDECE) e pavimentada a rodovia CE-060, a "estrada do algodão". Também tiveram início as obras do estádio Castelão.
Durante o governo de César Cals (1971-1975) se sucedeu o auge da repressão militar. Vários cearenses de esquerda estiveram envolvidos na Guerrilha do Araguaia[32]. Cals procurou governar tecnocraticamente, formando sua própria facção política e rompendo com Virgílio Távora. Seu sucessor, Adauto Bezerra (mandato de 1975 a 1978) não acontecem grandes mudanças. Adauto volta-se politicamente para o interior com a criação de uma secretaria de assuntos municipais. Renuncia seu mandato para se eleger deputado federal. O vice-governador Waldemar Alcntara toma posse e termina o mandato.
Virgilio Távora retorna ao governo em 1979, sendo o último eleito indiretamente, e resgata seu primeiro governo com a criação do PLAMEG II. Estabelece o Fundo de Desenvolvimento Industrial para complementar o sistema de incentivos regionais à indústria, impulsionando uma industrialização muito concentrada na Região Metropolitana de Fortaleza[33]. Criou-se o PROMOVALE (projetos de irrigação), e sua esposa, Luiza Távora, programou projetos sociais como a Central de Artesanato do Ceará. Seu governo foi marcado pela ausência, quase que total, de oposição na Assembléia, nomeações aproximadas de 16.000 pessoas para cargos públicos e várias greves. Em 1983, Gonzaga Mota foi eleito pelo voto popular, rompendo com os coronéis anteriores para criar seu próprio grupo político. Seu rompimento rendeu-lhe ataques do regime militar com a suspensão de verbas federais.
Nova República
A hegemonia de Tasso Jereissati na política cearense durou duas décadas.A Nova República começou no Ceará com a eleição de Maria Luiza para o cargo de prefeita de Fortaleza em 1985. Foi a primeira prefeita de capital estadual eleita pelo Partido dos Trabalhadores e a primeira mulher a ser eleita para esse cargo após o regime militar. A insatisfação com a política praticada durante a ditadura militar e o movimento de redemocratização impulsionaram as transformações no poder político, com a decadência da hegemonia tradicional do coronelismo[34].
Gonzaga Mota deixou o governo com pagamentos atrasados ao funcionalismo e descontrole nas contas públicas[35], mas seu candidato, o empresário Tasso Jereissati, conseguiu se eleger com a promessa de modernizar a administração pública e as finanças, afastando-se do clientelismo dos governos anteriores e desenvolvendo a economia estadual. A nova gestão passou a se autodenominar "Governo das Mudanças"[36]. Nas duas décadas seguintes, Jereissati e seus aliados passam a deter a hegemonia política no Estado, e rapidamente perdem a aliança com partidos mais à esquerda[34].
Ciro Gomes, então prefeito de Fortaleza, se candidatou e foi eleito em 1990 para o cargo de governador, apoiado por Tasso. Os "Governos das Mudanças" priorizam o aumento dos investimentos públicos e privados em infra-estrutura e nos setores industrial e de serviços, enquanto o agropecuário permanece à margem. Politicamente, há uma relativa diminuiçoão de poder dos "coronéis", com ampliaçã do poder do grande empresariado. O saneamento das contas estaduais - atingido, em parte, pela diminuição das despesas com o funcionalismo público através de demissões e achatamentos salariais - garantiu superávits entre 1988 e 1994, mas com a consolidação do Plano Real volta-se a uma predominncia de déficits[35].
Tasso foi eleito novamente em 1994 e reeleito em 1998, concentrando os esforços governamentais na construção e reforma de grandes obras, como o Porto do Pecem, o novo Aeroporto Internacional de Fortaleza e o Açude Castanhão. O terceiro "Governo das Mudanças" (1994-1997) se caracterizou pela privatização de empresas estatais e extinção de órgãos e pelo seguimento de políticas de cunho neoliberal, com enxugamento da administração, racionalização de investimentos, aumento de taxas de contribuição da aposentadoria, etc.[35] Lúcio Alcntara, eleito com o apoio de Tasso, continua, em linhas gerais, o modelo político anterior, mas não recebe apoio do próprio partido e não consegue se reeleger em 2006, rompendo com o PSDB e posteriormente mudando para o Partido da República. Cid Gomes, do PSB e ex-prefeito de Sobral, alcança o cargo de Governador, pondo fim à longa hegemonia do PSDB no Estado e sinalizando um movimento rumo à antiga oposição na política estadual, já demonstrado pela vitória de Luizianne Lins, do PT, na capital, que se elegera em 2004 mesmo sem apoio real do partido, o qual, devido às alianças partidárias nacionais, apoiara o candidato Inácio Arruda.[37] Em 2008, Luizianne Lins foi reeleita.
O Estado se beneficiou também da guerra fiscal, que então se iniciava, o que, somado à mão-de-obra barata, atraiu várias indústrias, as quais se concentraram em algumas poucas cidades. O crescimento médio do PIB, de 4,6%, foi superior à média nacional e nordestina nos anos 90, continuando a tendência iniciada na década de 70. As ações do governo, aliado aos esforços do empresariado local, e os incentivos de instituições de grande importncia na história econômica recente do Ceará, como o BNB e a Sudene, foram determinantes para tal desempenho.
O forró eletrônico se populariza na década de 1990, e o Ceará começa a despontar, seguindo a tendência do litoral nordestino, como grande pólo de turismo. Ao longo dessa década, com ações como o Programa de Saúde da Família (PSF), o Estado também realiza grandes avanços na redução da mortalidade infantil. A migração em direção a Fortaleza segue forte, tendo em vista o persistente atraso do interior em comparação com o forte crescimento da capital.[38] A segurança pública torna-se muito mais problemática entre 1990 e 2003, com a taxa de homicídios subindo de 8,86 para 20,15 por 100 mil habitantes.[39]
Apesar de vários avanços na saúde e educação básicas e do crescimento econômico estável, a chamada Era Tasso não alterou a estrutura socioeconômica problemática do Ceará, em especial a concentração de renda[34], que piorou entre 1991 e 2000[40], a má distribuição fundiária e a enorme disparidade regional (sobretudo entre a capital e o interior). Em 1999, segundo o Banco Mundial, metade dos cearenses viviam abaixo da linha de pobreza[35]. No início do século XXI, consolidou-se a tendência de queda na tradicional emigração de cearenses, que, no período 2001-2006, reverte-se para um saldo positivo de 38,3 mil pessoas, o que se atribui à melhoria das condições de vida e à maior estabilidade proporcionada por programas sociais, que permitiram a fixação do pobre em sua terra e o retorno de parte dos emigrantes[41].