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CONTOS: A INVASÃO DE RÃS - António Espadinha
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De: isaantunes  (Mensaje original) Enviado: 07/01/2012 19:20

Por fim chegava a primavera e a Natureza,contrariada pela letargia do sorumbático inverno, acordava agora com todo o seu esplendor.

Teria então onze anos e o meu tempo disponível era aproveitado para percorrer os campos e embriagar-me com a beleza que
por todo o lado despertava: espiava aazáfama dos pássaros na preparação dos ninhos, inalava o perfume das flores que
desabrochavam, inebriava-me com o ameno soprar da brisa e demorava-me a observar o fervilhar da vida nos pequenos charcos.
As fugidias rãs eram os pequenos animais que mais me fascinavam. Havia mesmo uma espécie cujos exemplares esguios e de cor verde saltavam delicadamente das ervas para o interior das poças de água. Eram conhecidos por relas.
Por essa altura frequentava as aulas de dona Noémia que todas as tardes me ia habilitando para a entrada no ensino liceal.
Mas, por entre os problemas de Aritmética e as lições de Português, projetava com antecipado prazer os passeios campestres do dia seguinte.
Dona Noémia, a professora primária da aldeia, hospedara-se em casa das meninas Selões e era aí que me deslocava para as
aulas. As meninas Selões eram três irmãs solteiras, na casa dos quarenta anos, muito diferentes fisicamente e com distintas
tarefas domésticas atribuídas. Dona Joana era baixa, roliça e espevitada. Dedicava-se à costura. Dona Ana era magra, de gestos
lentos e medidos, e tinha como tarefa a receção e entrega do correio do posto público da localidade. Mais recentemente
tornara-se também operadora do telefone,que acabava de ser inaugurado na aldeia.Dona Maria, igualmente magra, mas a mais
alta das três, sofria de acentuada miopia eera a cozinheira da casa.
Durante as aulas fui conhecendo melhor a minha professora até que, um dia, descobri que ela tinha medo de bichos. Logo imaginei
preparar-lhe uma partida que certamente me iria divertir imenso. Num dos meuspasseios ao campo levei uma pequena caixa
de cartão e, depois de pacientes e laboriosas diligências, consegui capturar seis relas que aprisionei na dita. Já em casa, guardei a caixa com os pobres batráquios na pasta da escola e, no dia seguinte, transportei-os na sua prisão para a aula da tarde.
Tudo decorria com a calma habitual.Aproveitei então a melhor oportunidade e,discretamente, soltei as rãs para debaixo da
mesa. Decorreram alguns minutos, as rãsdispersaram pelo soalho da sala, até que dona Noémia achou que tinha visto qualquer
coisa a mexer-se em direção ao guarda-fatos.Levantou-se para observar melhor e,perante um viscoso e repulsivo bicho, que
efetivamente descobriu aos saltos, soltou um estridente grito e subiu de imediato para a cadeira mais próxima. Dona Joana acudiu,
pressurosa, inquirindo pela causa daquela aflição da professora. Também dona Ana acorreu à sala de aula, mas cruzou-se no
percurso com outra rela, que tinha caminhado em direção oposta, fazendo-a recuar de medo. Dona Joana exclamou, emalvoroço, que descobrira mais uma...
Entretanto, tocou o telefone. Era dona Zalir, a chefe dos correios do concelho, para tratar d e u m a s s u n t o a d m i n i s t r a t i v o .
Imediatamente dona Ana lhe relatou que, inexplicavelmente, tinham a casa invadida de rãs.


- Mas têm alguma poça de água no quintal? -
  Inquiriu dona Zalir, incrédula.

- Não, e nunca tal tinha sucedido em nossa casa – respondeu dona   

Ana. - É umverdadeiro mistério.

Na sala de aula dona Noémia enrolou aspernas na saia-sombrinha de tecido aos quadrados vermelhos e pretos e mantinha-se
em altitude... não fossem as rãs subir-lhe pelas pernas acima. Por essa altura já donaJoana se ajoelhara no chão, investigando
debaixo dos móveis e pondo comicamente em realce o traseiro anafado. Gritou que tinha visto mais duas rãs debaixo da cama. Dona Maria abandonou então as tarefas da cozinhae, armada de toalha e de um espeto, avançou corajosamente para dar caça aos intrusosbatráquios.
A habitual pacatez da casa das meninas Selões convertera-se num pandemónio. Eu “ria para dentro”, divertidíssimo com o inesperado
sucesso da minha iniciativa. No meio do alvoroço geral e dos gritos, dona Noémia dispensou-me do resto da aula. Não tive outro
remédio senão partir, sem hipótese de assistirao desfecho daquela verdadeira comédia por mim originada. Ainda hoje imagino que as
desditosas rãs não terão conseguido escapar às arremetidas do espeto de dona Maria.Tantos anos passados é com imensa saudadeque ainda recordo a minha professora e as meninas Selões, vítimas desta minha brincadeira de rapaz. Todas elas já partiramdesta vida e não chegaram a saber que fui eu o
autor daquela insólita invasão de rãs. Só agorame penitencio dessa maldade, relatando erevivendo aqui o hilariante episódio.
As meninas Selões tinham um pequeno pomar de ameixeiras. Era em meados dejunho que iniciavam a venda dos frutos.
Quantas vezes, na minha infância, me desloquei a sua casa para comprar as ameixas azuladas cobertas pela branda névoa da
maturação! Brindavam-me sempre com uma mão-cheia, para além do peso adquirido, e diziam-me amorosamente que aquelas eram
para mim. Pessoas simples e humildes, patenteando uma grande bondade, asmeninas Selões ganharam perenemente um
sentimento de enorme ternura na minha memória. Num póstumo tributo de quemgostaria de poder compensá-las da travessura
das rãs, aqui lhes deixo esta modesta homenagem.


António Espadinha

In:http://www.cm-ferreira-alentejo.pt/images/stories/jornalpdf/JF_59.pdf



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Respuesta Eliminar Mensaje  Mensaje 2 de 2 en el tema 
De: mayrameireles Enviado: 08/01/2012 15:38
Isabel, Recebi um mail com o link do Jornal. Que lindos textos!!!!!!!!!! Como sempre! E, chorando emocionada pela Ti Pinheiro, respondi ao Espadinha: "Lindíssimos textos e , como já sabes, ri e chorei ao mesmo tempo, quando li sobre a transformação de pessoas em estrelas. Tens uma maneira de dizer...incrível. Para mim, nunca leio e sim assisto a um filme. Sem mais palavras, realmente impossibilitada emocionalmente, Beijinhos, Mayra" Beijinhos muitos também para ti, Isabel! Mayra


 
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