Tendências sincronatórias
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Na religião romana, o culto do deus grego Apolo (na imagem estátua romana de um original grego, no
Musei Capitolini,
Roma) foi sincronizado com o culto de
Sol Invicto. A adoração do sol como protetor do império permanceu como principal culto imperial até ser substiuído pelo
Cristianismo.
Durante a época do auge romano, apareceu uma tendência popular de sincronizar os múltiplos deuses gregos e estrangeiros em novos cultos estranhos e quase irreconhecíveis. A sincronização ocorreu principalmente pelo fato dos romanos terem um conjunto/panteão de mitos muito precário, fazendo com que a tradição de mitos gregos fossem misturadas com os principais deuses romanos (interligando equivalentes das duas tradições).[103] Os deuses Zeus e Júpiter são exemplos desse envolvimento mitológico. Ainda nessa etapa de combinação entre duas tradições mitológicas, tudo indica que a associação dos romanos com a religião oriental resultou em mais sincronizações.[109] Um exemplo é o culto do sol, introduzido em Roma depois das campanhas de Aureliano na Síria. As divindades Mitra e Baal, ambas asiáticas, foram sincronizadas com o deus grego Apolo e com Hélio numa só figura, o Deus Sol Invicto — que possuía (na imaginação dos povos) atributos somados e, nas práticas de cultos, ritos conglomerados.[110] Apolo podia ser cada vez mais identificado na religião com Hélios ou incluso com Dionísio, mas os textos que recapitulavam seus mitos raramente refletiam essas metamorfoses. A literatura mitológica tradicional estava cada vez mais disassociada das práticas religiosas reais.
A coleção de Hinos Órficos e da Saturnália de Macróbio, conservadas desde o século II, também estão influídas pelas teorias racionalistas e pelas tendências sincronatórias. Os hinos órficos são um conjunto de composições poéticas pré-clássicas, atribuídas à Orfeu. Na realidade, estes poemas foram provavelmente compostos por vários poetas, e contém um rico conjunto de pistas sobre a mitologia pré-históricas da Europa. O objetivo da Saturnália é a de transmitir a cultura helênica que havia obtido de suas leituras, apesar de seu tratamento dos deuses ser contaminado pela mitologia e pela teologia egípcia e norte-africana (que também acabam afetando a interpretação de Virgílio). Na Saturnália, reaparecem os comentários mitográficos influídos pelos evemeristas, estoicos e pelos neoplatônicos.[105]
Na seção anterior, vimos como os historiadores acreditam que os gregos começaram a dar novas interpretações acerca das coisas, e como começaram a desacreditar dos poetas e dos dramaturgos, insistentes em inventar narrativas e lendas sobre a origem e os motivos das coisas. Ao tentar aprofundar sua compreensão sobre os mitos gregos, o homem da Grécia antiga encontrou certas limitações e contradições nessas histórias, o que desencadeou em uma série de processos filosóficos. A filosofia surge justamente para compreender a verdade, mas de uma outra forma. Para a intelectual brasileira Marilena Chaui uma dessas contradições foi o fato de que os gregos começaram a realizar certas viagens marítimas e explorar algumas regiões das quais acreditavam serem habitadas por deuses, sendo que, quando a visitaram, puderam constatar que era povoada por seres humanos.[111]
Concepção de um
trirreme da Grécia Antiga: as explorações marítimas dos gregos – uma das primeiras do homem antigo – contribuíram para a decadência do mito.
Os estudiosos acreditam que os gregos, ao inventarem o calendário, conseguiram calcular o tempo como forma de prever e entender os estados térmicos e também o Sol, a chuva e outros fatores climáticos (vistos, anteriormente, como feitos divinos e incompreensíveis) e, assim, proporcionaram uma grande mudança na crença dos mitos.[16] De forma semelhante, a invenção da moeda como forma de trocas abstratas e a escrita alfabética como forma de materialização de textos outrora propagados somente pela oratória, (além da invenção da política para a exposição das opiniões sociais) foram marcos da sociedade grega que, com o início dessa vida urbana e um tanto mais moderna, começou a tecer bases para o artesanato, o comércio e outras criações que começaram a desprezar os mitos.
Com essas mudanças, o homem se viu em uma necessidade de entendê-las e de desenvolvê-las, no que se criou a filosofia para suprir essa incompreensão.[16] Os filósofos e estudiosos crêem, portanto, que as habilidades poderosas de mudança saíram das mãos dos deuses imaginários e foram assumidas pelos homens antigos (e se estendem até nossos dias atuais, onde, por exemplo, acreditamos que uma administração política adequada — realizada e levada em frente pelos homens e não pelos deuses — pode resultar numa influência positiva nas sociedades, assim como uma administração inadequada resulta em influências negativas).[16