| Dar 
um tempo na vida é tentar colocar a mesma em pausa. É quando nos encontramos 
numa  encruzilhada e, de repente, não sabemos qual caminho seguir.  É o medo de 
tomar decisões erradas que nos faz pensar que o melhor seria adiar pra ver 
depois no que pode dar. Só 
que a vida não é um filme que podemos parar um instante pra ir buscar um café e 
depois voltar e recomeçar de onde paramos. A vida é bem mais séria, bem mais 
exigente. Ela pede que tomemos decisões ; errar é um risco que todos correm. 
Quem pode afirmar, com cem por cento de certeza, que a decisão que toma é a 
certa, que tudo vai correr exatamente como se passa dentro da sua cabeça ? 
 O dia 
de amanhã não conhecemos. E é bem melhor assim. Imagino quanto sofrimento por 
antecipação haveria no mundo se soubéssemos com certeza absoluta o que vai 
acontecer. O conhecimento do futuro estragaria nosso presente. 
 Em 
1991 eu tive um caroço no seio. Foi horrível! Descobri à noite e até a manhã 
seguinte eu não pude dormir. A hipótese de que aquilo era uma coisa benigna e 
banal nem passou pela minha cabeça. Pensamentos negativos me assombraram a noite 
toda. Na manhã seguinte, fui ver o meu médico, um clínico geral. Ele examinou e 
me encaminhou para um especialista. No hospital, marcaram uma consulta para 
dezoito dias depois. Deus do céu ! Dezoito dias depois ! E como eu iria viver 
todos esses dias ? Talvez hoje, mais amadurecida, eu pudesse me repousar e me 
dizer de esperar, ter fé. Mas não naquela época. Milhões de coisas se passaram 
pela minha cabeça. Eu já me via morta, me perguntava como minha família iria 
reagir. E filhos ? Deus, eu nem tinha tido ainda tempo de ter filhos e já iria 
partir ! Não, eu não poderia esperar ainda dezoito dias para fazer a famosa 
mamografia. Liguei novamente para o meu médico, que se comunicou com o hospital 
e eles marcaram o tal exame para o dia seguinte. Mais 
uma noite sem dormir e lá estava eu, pronta para os exames. Já no primeiro, o 
médico disse que parecia algo banal, mas que para ter certeza eles fariam uma 
biopsia. O tal exame era desagradável. Enquanto faziam uma ultra-sonografia do 
seio, eles enfiaram uma agulha grossa para a retirada do material. Eu olhava 
atentivamente para o rosto do médico, acho que procurava nele uma expressão 
qualquer de preocupação. Ele parecia tranqüilo, fiquei tranqüila também. Ele me 
explicou que era provavelmente um fibroma, tumor benigno. Estavam fazendo o 
exame por segurança, mas que eu não deveria me preocupar. Disse que por causa do 
tamanho talvez fosse melhor retirá-lo, mas que aguardaríamos ainda uns seis 
meses e refaríamos um exame. Se o caroço estivesse crescendo, teriam que 
removê-lo por segurança, para que não riscasse de afetar os tecidos 
laterais. O 
resultado chegou e era mesmo o que ele tinha dito. Me tranqüilizei. Nem pensei 
nisso até o próximo exame. Mas no seguinte eu já estava grávida e não poderia 
fazer a mamografia. Fizemos então um simples exame de ultra-sonografia e a 
senhora que fez já disse imediatamente quando viu que era um fibroma. Ele 
parecia estável.  Dois 
anos depois eu já havia aprendido a conviver com aquilo dentro de mim. Sentia um 
pouco de medo, mas não me apavorava. Minha primeira filha tinha nascido e eu 
tinha muito o que aprender da vida para tentar ensinar pra 
ela. Quando resolvi fazer a mamografia de contrôle seguinte, 
fiquei grávida da segunda e não pude. E depois que ela nasceu eu fui. O caroço 
tinha desaparecido, ninguém sabe como. Ele era grande, tinha alguns centímetros 
e não estava mais lá, em lugar nenhum. Me lembro que meu médico riu quando eu 
disse que « il est allé se promener », ele tinha ido 
passear. Essa 
foi uma das minha experiências. Aprendi que não vale a pena a gente se preocupar 
com coisas que talvez nunca acontecerão. Eu sei que é bem mais fácil falar que 
agir, mas é um fato e acho que devemos nos exercitar a colocá-lo em prática. 
 Agora 
eu estou passando por um período de divórcio e as coisas não têm sido fáceis. 
Quando minhas amigas vêm a força com a qual eu encaro a situação ficam 
surpresas. Dizem que sou corajosa. Corajosa, eu ? Isso me surpreende. Não, não 
sou corajosa. Deus cuida de mim, é o que digo sempre.  Talvez devêssemos levar mais a sério a passagem bíblica 
dos lírios dos campos. E viver nossa vida de hoje como se amanhã não existisse. 
E deixar o filme rolar enquanto buscamos nosso cafezinho. Não se dá tempo na 
vida, porque a vida não pára o tempo pra gente. A gente vive minuto por minuto, 
segundo por segundo. E Deus está presente, porque Ele sim, é o mesmo de ontem, 
de hoje e de amanhã.  Letícia 
Thompson  |