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Enviado: 16/10/2008 19:47 |
Descrição
Cecília Meireles
Amanheceu pela terra um vento de estranha sombra, que a tudo declarou guerra.
Paredes ficaram tortas, animais enlouqueceram e as plantas caíram mortas.
O pálido mar tão branco levantava e desfazia um verde-lívido flanco.
E pelo céu, tresmalhadas, iam nuvens sem destino, em fantásticas brigadas.
Dos linhos claros da areia fez o vento retorcidas, rotas, miseráveis teias.
Que sopro de ondas estranhas! Que sopro nos cemitérios! pelos campos e montanhas!
Que sopro forte e profundo! Que sopro de acabamento! Que sopro de fim de mundo!
Da varanda do colégio, do pátio do sanatório, miravam tal sortilégio
olhos quietos de meninos, com esperanças humanas e com terrores divinos.
A tardinha serenada foi dormindo, foi dormindo, despedaçada e calada.
Só numa ruiva amendoeira uma cigarra de bronze, por brio de cantadeira
girava em esquecimento à sanha enorme do vento, forjando o seu movimento num grave cntico lento...
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Cecília Meireles
Tenho fases, como a lua Fases de andar escondida, fases de vir para a rua... Perdição da minha vida ! Perdição da vida minha ! Tenho fases de ser tua, tenho outras de ser sozinha.
Fases que vão e que vêm, no secreto calendário que um astrólogo arbitrário inventou para meu uso.
E roda a melancolia seu interminável fuso ! Não me encontro com ninguém (tenho fases, como a lua ...) No dia de alguém ser meu não é dia de eu ser sua ... E, quando chega esse dia, o outro desapareceu ...
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Cecília Meireles
Amanheceu pela terra um vento de estranha sombra, que a tudo declarou guerra.
Paredes ficaram tortas, animais enlouqueceram e as plantas caíram mortas.
O pálido mar tão branco levantava e desfazia um verde-lívido flanco.
E pelo céu, tresmalhadas, iam nuvens sem destino, em fantásticas brigadas.
Dos linhos claros da areia fez o vento retorcidas, rotas, miseráveis teias.
Que sopro de ondas estranhas! Que sopro nos cemitérios! pelos campos e montanhas!
Que sopro forte e profundo! Que sopro de acabamento! Que sopro de fim de mundo!
Da varanda do colégio, do pátio do sanatório, miravam tal sortilégio
olhos quietos de meninos, com esperanças humanas e com terrores divinos.
A tardinha serenada foi dormindo, foi dormindo, despedaçada e calada.
Só numa ruiva amendoeira uma cigarra de bronze, por brio de cantadeira
girava em esquecimento à sanha enorme do vento, forjando o seu movimento num grave cntico lento...
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Canção do Amor-Perfeito
Cecília Meireles Melhores Poemas, Global Editora, 1977 - SP, Brasil
O tempo seca a beleza. seca o amor, seca as palavras. Deixa tudo solto, leve, desunido para sempre como as areias nas águas.
O tempo seca a saudade, seca as lembranças e as lágrimas. Deixa algum retrato, apenas, vagando seco e vazio como estas conchas das praias.
O tempo seca o desejo e suas velhas batalhas. Seca o frágil arabesco, vestígio do musgo humano, na densa turfa mortuária.
Esperarei pelo tempo com suas conquistas áridas. Esperarei que te seque, não na terra, Amor-Perfeito, num tempo depois das almas.
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Primavera
A primavera chegará, mesmo que ninguém mais saiba seu nome, nem acredite no calendário, nem possua jardim para recebê-la. A inclinação do sol vai marcando outras sombras; e os habitantes da mata, essas criaturas naturais que ainda circulam pelo ar e pelo chão, começam a preparar sua vida para a primavera que chega.
Finos clarins que não ouvimos devem soar por dentro da terra, nesse mundo confidencial das raízes, — e arautos sutis acordarão as cores e os perfumes e a alegria de nascer, no espírito das flores.
Há bosques de rododendros que eram verdes e já estão todos cor-de-rosa, como os palácios de Jeipur. Vozes novas de passarinhos começam a ensaiar as árias tradicionais de sua nação. Pequenas borboletas brancas e amarelas apressam-se pelos ares, — e certamente conversam: mas tão baixinho que não se entende.
Oh! Primaveras distantes, depois do branco e deserto inverno, quando as amendoeiras inauguram suas flores, alegremente, e todos os olhos procuram pelo céu o primeiro raio de sol.
Esta é uma primavera diferente, com as matas intactas, as árvores cobertas de folhas, — e só os poetas, entre os humanos, sabem que uma Deusa chega, coroada de flores, com vestidos bordados de flores, com os braços carregados de flores, e vem dançar neste mundo cálido, de incessante luz.
Mas é certo que a primavera chega. É certo que a vida não se esquece, e a terra maternalmente se enfeita para as festas da sua perpetuação.
Algum dia, talvez, nada mais vai ser assim. Algum dia, talvez, os homens terão a primavera que desejarem, no momento que quiserem, independentes deste ritmo, desta ordem, deste movimento do céu. E os pássaros serão outros, com outros cantos e outros hábitos, — e os ouvidos que por acaso os ouvirem não terão nada mais com tudo aquilo que, outrora se entendeu e amou.
Enquanto há primavera, esta primavera natural, prestemos atenção ao sussurro dos passarinhos novos, que dão beijinhos para o ar azul. Escutemos estas vozes que andam nas árvores, caminhemos por estas estradas que ainda conservam seus sentimentos antigos: lentamente estão sendo tecidos os manacás roxos e brancos; e a eufórbia se vai tornando pulquérrima, em cada coroa vermelha que desdobra. Os casulos brancos das gardênias ainda estão sendo enrolados em redor do perfume. E flores agrestes acordam com suas roupas de chita multicor.
Tudo isto para brilhar um instante, apenas, para ser lançado ao vento, — por fidelidade à obscura semente, ao que vem, na rotação da eternidade. Saudemos a primavera, dona da vida — e efêmera.
Cecília Meireles Texto extraído do livro Cecília Meireles - Obra em Prosa
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Menino, não morras, porque a lua cheia vai-se levantando do mar. São de prata e de ouro as águas e a areia. Não morras agora, vem ver o luar!
Menino, não morras: na dormente mata, uma flor vai desabrochar. É azul! É roxa? É de ouro? É de prata? Não morras agora! Vem ver o luar!
Menino, não morras: verdes vaga-lumes correm, num brilhante colar. São de prata e de ouro todos os perfumes. Não morras agora! Vem ver o luar.
Menino, não morras: ouve a serenata que sussura nas cordas do ar... São cordas de sonho, são de ouro e de prata. Não morras agora! Vem ver o luar.
Menino, não morras: sobre o céu deserto, há uma estrela imensa a brilhar. É de prata e de ouro! Como está tão perto! Não morras agora, - que a estrela da aurora veio ver teu rosto banhado de luar!
Cecília Meireles
SERENATA AO MENINO DO HOSPITAL | | | | | | |
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Se Não Houvesse Montanhas
Se não houvesse montanhas! Se não houvesse paredes! Se o sonho tecesse malhas e os braços colhessem redes!
Se a noite e o dia passassem como nuvens, sem cadeias, e os instantes da memória fossem vento nas areias!
Se não houvesse saudade,
solidão nem despedida... Se a vida inteira não fosse,
além de breve, perdida!
Eu não tinha cavalo de asas, que morreu sem ter pascigo E em labirintos se movem Os fantasmas que persigo.
Cecília Meireles
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Cecília Meireles
De um lado, a eterna estrela, E do outro a vaga incerta,
meu pé dançando pela extremidade da espuma, e meu cabelo por uma planície de luz deserta.
Sempre assim: de um lado, estandartes do vento... --- do outro, sepulcros fechados. E eu me partindo, dentro de mim, para estar no mesmo momento de ambos os lados.
Se existe a tua Figura, se és o Sentido do Mundo, deixo-me, fujo por ti, nunca mais quero ser minha !
(Mas, neste espelho, no fundo desta fria luz marinha, como dois baços peixes, nadam meus olhos à minha procura ... Ando contigo --- e sozinha. Vivo longe --- e acham-me aqui ...)
Fazedor da minha vida, não me deixes ! Entende a minha canção ! Tem pena do meu murmúrio reúne-me em tua mão !
Que eu sou gota de mercúrio dividida desmanchada pelo chão ...
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Nadador
Cecília Meireles Os Cem Melhores Poemas Brasileiros do Século, Editora Objetiva, 2001 - Rio de Janeiro, Brasil
O que me encanta é a linha alada das tuas espáduas, e a curva que descreves, pássaro da água!
É a tua fina, ágil cintura, e esse adeus da tua garganta para cemitérios de espuma!
É a despedida, que me encanta, quando te desprendes ao vento, fiel à queda, rápida e branda
E apenas por estar prevendo, longe, na eternidade da água, sobreviver teu movimento...
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Vôo
Cecília Meireles Melhores Poemas, Global Editora, 1984 - S.Paulo, Brasil
Alheias e nossas as palavras voam. Bando de borboletas multicores, as palavras voam Bando azul de andorinhas, bando de gaivotas brancas, as palavras voam. Viam as palavras como águias imensas. Como escuros morcegos como negros abutres, as palavras voam.
Oh! alto e baixo em círculos e retas acima de nós, em redor de nós as palavras voam. E às vezes pousam.
| | By BéBé | | | | | | | |
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