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Procura a maravilha.
Onde um beijo sabe a barcos e bruma.
No brilho redondo e jovem dos joelhos.
Na noite inclinada de melancolia.
Procura.
Procura a maravilha....
(Eugénio de Andrade)
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Abril
Brinca a manhã feliz e descuidada, como só a manhã pode brincar, nas curvas longas desta estrada onde os ciganos passsam a cantar.
Abril anda à solta nos pinhais coroado de rosas e de cio, e num salto brusco, sem deixar sinais, rasga o céu azul num assobio.
Surge uma criança de olhos vegetais, carregados de espanto e de alegria, e atira pedras às curvas mais distantes - onde a voz dos ciganos se perdia.
(Eugénio de Andrade)
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A Palmeira Jovem (Eugênio de Andrade)
Como a palmeira jovem que Ulisses viu em Delos, assim
esbelto era o dia em que te encontrei;
assim esbelta era a noite em que te despi,
e como um potro na planície nua em ti entrei.
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Adeus (Eugênio de Andrade) Como se houvesse uma tempestade escurecendo os teus cabelos, ou, se preferes, minha boca nos teus olhos carregada de flor e dos teus dedos;
como se houvesse uma criança cega aos tropeções dentro de ti, eu falei em neve - e tu calavas a voz onde contigo me perdi.
Como se a noite se viesse e te levasse, eu era só fome o que sentia; Digo-te adeus, como se não voltasse ao país onde teu corpo principia.
Como se houvesse nuvens sobre nuvens e sobre as nuvens mar perfeito, ou, se preferes, a tua boca clara singrando largamente no meu peito.
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É urgente o amor.
É urgente um barco no mar.
É urgente destruir certas palavras, ódio, solidão e crueldade, alguns lamentos, muitas espadas.
É urgente inventar alegria, multiplicar os beijos, as searas, é urgente descobrir rosas e rios e manhãs claras.
Cai o silêncio nos ombros e a luz impura, até doer. É urgente o amor, é urgente permanecer.
Eugénio de Andrade
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Respiro o teu corpo
Respiro o teu corpo: sabe a lua-de-água ao amanhecer, sabe a cal molhada, sabe a luz mordida, sabe a brisa nua, ao sangue dos rios, sabe a rosa louca, ao cair da noite sabe a pedra amarga, sabe à minha boca.
Eugénio de Andrade
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A boca,
onde o fogo de um verão muito antigo
cintila,
a boca espera
(que pode uma boca esperar senão outra boca?)
espera o ardor do vento para ser ave,
e cantar.
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Eugénio de Andrade
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AS PALAVRAS INTERDITAS
Eugénio de Andrade
Os navios existem e existe o teu rosto encostado ao rosto dos navios. Sem nenhum destino flutuam nas cidades, partem no vento, regressam nos rios.
Na areia branca, onde o tempo começa, uma criança passa de costas para o mar. Anoitece. Não há dúvida, anoitece. É preciso partir, é preciso ficar.
Os hospitais cobrem-se de cinza Ondas de sombra quebram nas esquinas. Amo-te... E abrem-se janelas mostrando a brancura das cortinas.
As palavras que te envio não interditas até, meu amor, pelo halo das searas; se alguma regressasse, nem já reconhecia o teu nome nas minhas curvas claras.
Dói-me esta água, este ar que se respira, dói-me esta solidão de pedra escura, e estas mãos nocturnas onde aperto os meus dias quebrados na cintura.
E a noite cresce apaixonadamente. Nas suas margens vivas, desenhadas, cada homem tem apenas para dar um horizonte de cidades bombardeadas.
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URGENTEMENTE
É urgente o amor.
É urgente um barco no mar.
É urgente destruir certas palavras, ódio, solidão e crueldade, alguns lamentos, muitas espadas.
É urgente inventar alegria, multiplicar os beijos, as searas, é urgente descobrir rosas e rios e manhãs claras.
Cai o silêncio nos ombros e a luz impura, até doer. É urgente o amor, é urgente permanecer.
Eugénio de Andrade
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Não Canto Porque Sonho
Não canto porque sonho. Canto porque és real. Canto o teu olhar maduro, O teu sorriso puro, A tua graça animal.
Canto porque sou homem. Se não cantasse seria somente um bicho sadio embriagado na alegria da tua vinha sem vinha.
Canto porque o amor apetece. Porque o feno amadurece nos teus braços deslumbrados. Porque o meu corpo estremece Por vê-los nus e suados.
Eugénio de Andrade
in «As Mãos e os Frutos»
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Março voltou
Eugénio de Andrade
Março voltou, esta ácida loucura de pássaros está outra vez à nossa porta, o ar de vidro vai direito ao coração. Também elas cantam, as montanhas: somente nenhum de nós as ouve, distraídos
com o monótono silabar do vento ou doutros peregrinos. Já sabeis como temos ainda restos de pudor.
e pelo mundo uma enorme, enorme indiferença.
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O sal da língua
Eugénio de Andrade
Escuta, escuta: tenho ainda
uma coisa a dizer.
Não é importante, eu sei, não vai
salvar o mundo, não mudará
a vida de ninguém - mas quem
é hoje capaz de salvar o mundo
ou apenas mudar o sentido
da vida de alguém?
Escuta-me, não te demoro.
É coisa pouca, como a chuvinha
que vem vindo devagar.
São três, quatro palavras, pouco
mais. Palavras que te quero confiar,
para que não se extinga o seu lume,
o seu lume breve.
Palavras que muito amei,
que talvez ame ainda.
Elas são a casa, o sal da língua.
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Não Canto Porque Sonho
Não canto porque sonho. Canto porque és real. Canto o teu olhar maduro, O teu sorriso puro, A tua graça animal.
Canto porque sou homem. Se não cantasse seria somente um bicho sadio embriagado na alegria da tua vinha sem vinha.
Canto porque o amor apetece. Porque o feno amadurece nos teus braços deslumbrados. Porque o meu corpo estremece Por vê-los nus e suados.
Eugénio de Andrade
in «As Mãos e os Frutos»
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Reflexões sobre mulheres
Elas são as mães: rompem do inferno, furam a treva, arrastando os seus mantos na poeira das estrelas.
Animais sonmbulos, dormem nos rios, na raiz do pão.
Na vulva sombria é onde fazem o lume: ali têm casa. Em segredo, escondem o latir lancinante dos seus cães.
Nos olhos, o relmpago negro do frio.
Longamente bebem o silencio nas próprias mãos.
O olhar desafia as aves: o seu voo é mais fundo.
Sobre si se debruçam a escutar os passos do crepúsculo.
Despem-se ao espelho para entrarem nas águas da sombra.
É quando dançam que todos os caminhos levam ao mar.
São elas que fabricam o mel, o aroma do luar, o branco da rosa.
Quando o galo canta Desprendem-se para serem orvalho.
Eugénio de Andrade
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Entre os teus lábios é que a loucura acode, desce à garganta, invade a água.
No teu peito é que o pólen do fogo se junta à nascente, alastra na sombra.
Nos teus flancos é que a fonte começa a ser rio de abelhas, rumor de tigre.
Da cintura aos joelhos é que a areia queima, o sol é secreto, cego o silêncio.
Deita-te comigo. Ilumina meus vidros. Entre lábios e lábios toda a música é minha.
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Eugénio de Andrade
Pequena elegia de setembro
Não sei como vieste, mas deve haver um caminho para regressar da morte.
Estás sentada no jardim, as mãos no regaço cheias de doçura, os olhos pousados nas últimas rosas dos grandes e calmos dias de setembro.
Que música escutas tão atentamente que não dás por mim? Que bosque, ou rio, ou mar? Ou é dentro de ti que tudo canta ainda?
Queria falar contigo, dizer-te apenas que estou aqui, mas tenho medo, medo que toda a música cesse e tu não possas mais olhar as rosas. Medo de quebrar o fio com que teces os dias sem memória.
Com que palavras ou beijos ou lágrimas se acordam os mortos sem os ferir, sem os trazer a esta espuma negra onde corpos e corpos se repetem, parcimoniosamente, no meio de sombras?
Deixa-te estar assim, ó cheia de doçura, sentada, olhando as rosas, e tão alheia que nem dás por mim.
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Remetente : Inês Escobar de Lima |
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Hoje venho dizer-te que nevou no rosto familiar que te esperava. Não é nada, meu amor, foi um pássaro, a casca do tempo que caiu, uma lágrima, um barco, uma palavra.
Foi apenas mais um dia que passou entre arcos e arcos de solidão; a curva dos teus olhos que se fechou, uma gota de orvalho, uma só gota, secretamente morta na tua mão.
Eugénio de Andrade,
As Palavras Interditas
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AS PALAVRAS
São como um cristal, as palavras. Algumas, um punhal, um incêndio. Outras, orvalho apenas.
Secretas vêm, cheias de memória. Inseguras navegam:barcos ou beijos, as águas estremecem.
Desamparadas, inocentes, leves. Tecidas são de luz e são a noite. E mesmo pálidas verdes
paraísos lembram ainda.
Quem as escuta? Quem as recolhe, assim, cruéis, desfeitas, nas suas conchas puras?
Eugénio de Andrade
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