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BIBLIOTECA DA LUSOFONIA: CAMÕES ( LUÍS VAZ DE CAMÕES )
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Respuesta  Mensaje 1 de 14 en el tema 
De: QUIM TROVADOR  (Mensaje original) Enviado: 30/11/2009 09:49
 
 
 

II

Canção

 

A instabilidade da Fortuna,

os enganos suaves de Amor cego,

(suaves, se duraram longamente),

direi, por dar à vida algum sossego;

que, pois a grave pena me importuna,

importune meu canto a toda a gente.

E se o passado bem co mal presente

me endurece a voz no peito frio,

o grande desvario

dará de minha pena sinal certo,

que um erro em tantos erros é concerto.

E, pois nesta verdade me confio

(se verdade se achar no mal que digo),

saiba o mundo de Amor o desconcerto,

que já co a Razão se fez amigo,

só por não deixar culpa sem castigo.

Já Amor fez leis, sem ter comigo algüa;

já se tornou, de cego, arrazoado,

só por usar comigo sem-razões.

E, se em algüa cousa o tenho errado,

com siso, grande dor não vi nenhüa,

nem ele deu sem erros afeições.

Mas, por usar de suas isenções,

buscou fingidas causas por matar-me;

que, para derrubar-me

no abismo infernal de meu tormento,

não foi soberbo nunca o pensamento,

nem pretende mais alto alevantar-me

daquilo que ele quis; e se ele ordena

que eu pague seu ousado atrevimento,

saiba que o mesmo Amor que me condena

me fez cair na culpa e mais na pena.

Os olhos que eu adoro, aquele dia

que desceram ao baixo pensamento,

nalma os aposentei suavemente;

e pretendendo mais, como avarento,

o coração lhe dei por iguaria,

que a meu mandado tinha obediente.

Porém como ante si lhe foi presente

que entenderam o fim de meu desejo,

ou por outro despejo, que a língua

descobriu por desvario,

de sede morto estou posto num rio,

onde de meu serviço o fruto vejo;

mas logo se alça se a colhê-lo venho,

e foge-me a água, se beber porfio;

assi que em fome e sede me mantenho:

não tem Tntalo a pena que eu sustenho.

 

Despois que aquela em quem minhalma vive

quis alcançar o baixo atrevimento,

debaixo deste engano a alcancei:

a nuvem do contino pensamento

ma afigurou nos braços, e assi a tive,

sonhando o que acordado desejei.

Porque a meu desejo me gabei

de alcançar um bem de tanto preço,

além do que padeço,

atado em üa roda estou penando,

que em mil mudanças me anda rodeando

onde, se a algum bem subo, logo deço,

e assi ganho e perco a confiança;

e assi me tem atado ua vingança,

como Ixião, tão firme na mudança.

Quando a vista suave e inumana

meu humano desejo, de atrevido,

cometeu, sem saber o que fazia

(que de sua beleza foi nacido)

o cego Moço, que, co a seta insana,

o pecado vingou desta ousadia),

e afora este mal que eu merecia,

me deu outra maneira de tormento:

que nunca o pensamento,

que sempre voa düa a outra parte,

destas entranhas tristes bem se farte,

imaginando sobre o famulento,

quanto mais come, mais está crecendo,

porque de atormentar-me não se aparte;

assi que para a pena estou vivendo,

sou outro novo Ticio, e não me entendo.

De vontades alheias, que roubava,

e que enganosamente recolhia

em meu fingido peito, me mantinha.

De maneira o engano lhe fingia,

que despois que a meu mando as sojugava,

com amor as matava, que eu não tinha.

Porém, logo o castigo que convinha

o vingativo Amor me fez sentir,

fazendo-me subir

ao monte da aspereza que em vós vejo,

co pesado penedo do desejo,

que do cume do bem me vai cair;

torno a subi-lo ao desejado assento,

torna a cair-me; embalde, enfim, pelejo.

Não te espantes, Sísifo, deste alento,

que as costas o subi do sofrimento.

Destarte o sumo bem se me oferece

ao faminto desejo, porque sinta

a perda de perdê-lo mais penosa.

Como o avaro a quem o sonho pinta

achar tesouro grande, onde enriquece

e farta sua sede cobiçosa.

e acordando com fúria pressurosa

vai cavar o lugar onde sonhava,

mas tudo o que buscava

lhe converte em carvão a desventura;

 

ali sua cobiça mais se apura,

por lhe faltar aquilo que esperava:

destarte Amor me faz perder o siso.

Porque aqueles que estão na noite escura,

nunca sentirão tanto o triste abiso,

se ignorarem o bem do Paraíso.

Canção, nô mais, que já não sei que digo;

mas porque a dor me seja menos forte,

diga o pregão a causa desta morte.

 



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Respuesta  Mensaje 2 de 14 en el tema 
De: LOVE GIRL Enviado: 01/12/2009 10:18

 
   

 

 

 
 

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Alma Minha Gentil, Que Te Partiste


Alma minha gentil, que te partiste
tão cedo desta vida descontente,
repousa lá no Céu eternamente,
e viva eu cá na terra sempre triste.

Se lá no assento etéreo, onde subiste,
memória desta vida se consente,
não te esqueças daquele amor ardente
que já nos olhos meus tão puro viste.

E se vires que pode merecerte
alguma cousa a dor que me ficou
da mágoa, sem remédio, de perderte,

roga a Deus, que teus anos encurtou,
que tão cedo de cá me leve a verte,
quão cedo de meus olhos te levou.

(Luis Vaz de Camões)


                                                                                    

 


Respuesta  Mensaje 3 de 14 en el tema 
De: LOVE GIRL Enviado: 01/12/2009 10:19
Fermosos olhos ...
 
Fermosos olhos que na idade nossa
mostrais do Céu certissimos sinais,
se quereis conhecer quanto possais,
olhai me a mim, que sou feitura vossa.

Vereis que de viver me desapossa
aquele riso com que a vida dais;
vereis como de Amor não quero mais,
por mais que o tempo corra e o dano possa.

E se dentro nestalma ver quiserdes,
como num claro espelho, ali vereis
também a vossa, angélica e serena.

Mas eu cuido que só por não me verdes,
ver vos em mim, Senhora, não quereis:
tanto gosto levais de minha pena!

Luis de Camões

Respuesta  Mensaje 4 de 14 en el tema 
De: LOVE GIRL Enviado: 01/12/2009 10:22
 

 

 Dai-me uma lei, Senhora

 

Dai-me uma lei Senhora, de querer-vos, 

por que a guarde, sob pena de enojar-vos;  

pois a fé que me obriga a tanto amar-vos  

fará que fique em lei de obedecer-vos. 

 

Tudo me defendei, senão só er-vos 

e dentro na minha alma contemplar-vos; 

que, se assim não chegar a contentar-vos, 

ao menos nunca chegue a aborrecer-vos. 

 

E, se essa condição cruel e esquiva 

que me deis lei de vida não consente, 

dai-ma, Senhora, já: seja de morte. 

 

Se nem essa me dais, é bem que viva, 

sem saber como vivo, tristemente; 

mas contente estarei com minha sorte.

 

 (Luis  Vaz  de  Camões) 


 
   

 

 

 

Verdes são os campos,

De cor de limão:

Assim são os olhos

Do meu coração.

Campo, que te estendes

Com verdura bela;

Ovelhas, que nela

Vosso pasto tendes,

De ervas vos mantendes

Que traz o Verão,

E eu das lembranças

Do meu coração.

Gado que pasteis

Com contentamento,

Vosso mantimento

Não no entendereis

Isso que comeis

Não são ervas, não:

São graças dos olhos

Do meu coração.

( Luis de Camões )


 
   
 
 

 

Luís Vaz de Camões




O POETA  SIMÓNIDES,  FALANDO




O Poeta Simónides, falando
co capitão Temístocles, um dia,
em cousas de ciência praticando,

üa arte singular lhe prometia,
que então compunha, com que lhe ensinasse
a se lembrar de tudo o que fazia;

onde tão sutis regras lhe mostrasse
que nunca lhe passasse da memória
em nenhum tempo as cousas que passasse.

Bem merecia, certo, fama e glória
quem dava regra contra o esquecimento
que enterra em si qualquer antiga história.

Mas o capitão claro, cujo intento
bem diferente estava, porque havia
as passadas lembranças por tormento,

«o ilustre Simónides – dizia –
pois tanto em teu engenho te confias
que mostras à memória nova via?

Se me desses üa arte que em meus dias
me não lembrasse nada do passado,
oh! quanto milhor obra me farias!»

Se este excelente dito ponderado
fosse por quem se visse estar ausente,
em longas esperanças degradado,

oh! como bradaria justamente:
«Simónides, inventa novas artes;
não meças o passado co presente!»

Que, se e forçado andar por várias partes
buscando e vida algum descanso honesto,
que tu, Fortuna injusta, mal repartes;

e se o duro trabalho e manifesto
que, por grave que seja, há-de passar-se
com animoso esprito e ledo gesto;

de que serve às pessoas alembrar-se
do que se passou já, pois tudo passa,
senão de entristecer-se e magoar-se?

Se noutro corpo üa alma se traspassa,
– não, como quis Pitágoras, na morte
mas, como manda Amor, na vida escassa –;

e se este Amor no mundo está de sorte
que na virtude só dum lindo objecto
tem um corpo sem alma, vivo e forte;

onde este objecto falta, que é defecto
tamanho para a vida, que já nela
me está chamando à pena a dura Alecto;

porque me não criara minha estrela
selvático no mundo, e habitante
na dura Cítia, ou na aspereza dela?

Ou no Cáucaso horrendo, fraco infante,
criado ao peito dalgüa tigre hircana?
Homem fora formado de diamante,

porque a cerviz ferina e inumana
não sometera ao jugo e dura lei
daquele que de vida quando engana.

Ou, em pago das águas que estilei,
as que do mar passei foram de Lete,
para que me esquecera o que passei.

Que o bem que a esperança vã promete,
ou a morte o estorva, ou a mudança,
que e mal que üa alma em lágrimas derrete.

Já, Senhor, cairá como a lembrança,
no mal, do bem passado é triste e dura,
pois nace aonde morre a esperança.

E se quiser saber como se apura
nüa alma saudosa, não se enfade
de ler tão longa e mísera escritura.

Soltava Eolo a rédea e liberdade
ao manso Favónio brandamente,
e eu já tinha solta a saudade.

Neptuno tinha posto o seu tridente;
a proa a branca escuma dividia,
co a gente marítima contente.

O coro das Nereidas nos seguia;
os ventos, namorada Galateia
consigo, sossegados, os movia.

Das argênteas conchinhas, Panopeia
andava pelo mar fazendo molhe,
Melaneto, Dinamene, com Ligeia.

Eu, trazendo lembranças por antolhos
trazia os olhos na água sossegada,
e a água sem sossego nos meus olhos.

A bem-aventurança já passada
diante de mim tinha tão presente
como se não mudasse o tempo nada.

E com o gesto imoto e descontente
cum suspiro profundo e mal ouvido
por não mostrar meu mal a toda a gente,

dizia: ó claras Ninfas! Se o sentido
em puro amor tivestes, e inda agora
da memória o não tendes esquecido;

se, porventura, fordes algüa hora
aonde entra o grão Tejo a dar tributo
a Tétis, que vos tendes por Senhora;

ou por verdes o prado verde enxuto,
ou por colherdes ouro rutilante,
das tágicas areias rico fruto;

nelas em verso heróico e elegante,
escrevei cüa concha o que em mim vistes:
pode ser que algum peito se quebrante.

E contando de mim memórias tristes,
os pastores do Tejo, que me ouviam,
ouçam de vós as mágoas que me ouvistes.

Elas, que já no gesto me entendiam
nos meneios das ondas me mostravam
que em quanto lhes pedia consentiam.

Estas lembranças, que me acompanhavam
pola tranquilidade da bonança,
nem na tormenta grave me deixavam.

Porque, chegado ao Cabo da Esperança,
começo da saudade que renova,
lembrando a longa e áspera mudança;

debaixo estando já da estrela nova,
que no novo hemisfério resplandece,
dando do segundo axe certa prova;

eis a noite com nuvens escurece,
do ar supitamente foge o dia,
e o largo oceano se embravece.

A máquina do mundo parecia
que em tormenta se vinha desfazendo,
em serras todo o mar se convertia.

Lutando, Bóreas fero e Noto horrendo
sonoras tempestades levantavam,
das naus as velas côncavas rompendo.

As cordas, co ruído, assoviavam;
os marinheiros, já, desesperados,
com gritos para o Céu o ar coalhavam.

Os raios por Vulcano fabricados
vibrava o fero e áspero Tonante,
tremendo os Pólos ambos, de assombrados!

Ali Amor mostrando-se possante
e que por nenhum modo não fugia,
– mas quanto mais trabalho, mais constante –

vendo a morte diante em mim, dizia:
«Se algüa hora, Senhora, vos lembrasse,
nada do que passei me lembraria».

Enfim, nunca houve cousa que mudasse
o firme Amor do intrínseco daquele
em cujo peito üa vez de siso entrasse.

üa cousa, Senhor, por certo assele:
que nunca Amor se afina nem se apura,
enquanto está presente a causa dele.

Destarte me chegou minha ventura
a esta desejada e longa terra,
de todo o pobre honrado sepultura.

Vi quanta vaidade em nós se encerra,
e dos próprios quão pouca; contra quem
foi logo necessário termos guerra:

que üa ilha que o rei de Porcá tem,
que o rei da Pimenta lhe tomara,
fomos tomar-lha, e sucedeu-nos bem.

Com üa armada grossa, que ajuntara
o viso-rei de Goa, nos partimos
com toda a gente de armas que se achara,

e com pouco trabalho destruímos
a gente no curvo arco exercitada;
com mortes, com incêndios, os punimos.

Era a ilha com águas alagada,
de modo que se andava em almadias;
enfim, outra Veneza trasladada.

Nela nos detivemos sós dous dias,
que foram para alguns os derradeiros,
que passaram de Estige as águas frias.

Que estes são os remédios verdadeiros
que para a vida estão aparelhados
aos que a querem ter por cavaleiros.

Oh! lavradores, bem-aventuradas
se conhecessem seu contentamento!
Como vivem no campo sossegados!

Dá-lhes a justa terra o mantimento,
dá-lhes a fonte clara a água pura,
mungem suas ovelhas cento a cento.

Não vêem o mar irado, a noite escura,
por ir buscar a pedra do Oriente;
não temem o furor da guerra dura.

Vive um com suas árvores contente,
sem lhe quebrar o sono sossegado
o cuidado do ouro reluzente.

Se lhe falta o vestido perfumado,
e da fermosa cor assíria tinto,
e dos torçais atálicos lavrado;

se não têm as delícias de Corinto,
e se de Pário os mármores lhe faltam,
o piropo, a esmeralda, e o jacinto;

se suas casas de ouro não se esmaltam,
esmalta-se-lhe o campo de mil flores,
onde os cabritos seus, comendo, saltam.

Ali amostra o campo várias cores,
vêem-se os ramos pender co fruto ameno,
ali se afina o campo dos pastores;

ali cantara Títiro e Sileno.
Enfim, por estas partes caminhou
a sã Justiça para e Céu sereno.

Ditoso seja aquele que alcançou
poder viver na doce companhia
das mansas ovelhinhas que criou!

Este, bem facilmente alcançaria
as causas naturais de toda a cousa:
como se gera a chuva e neve fria;

os trabalhos do Sol, que não repousa;
e porque nos dá a Lüa a luz alheia,
se tolher-nos de Febo os raios ousa;

e como tão depressa o Céu rodeia;
e como um só os outros traz consigo;
e se é benina ou dura Citereia.

Bem mal pode entender isto que digo
quem há-de andar seguindo o fero Marte,
que traz os olhos sempre em seu perigo.

Porém seja, senhor, de qualquer arte,
que, posto que a Fortuna possa tanto
que tão longe de todo o bem me aparte,

não poderá apartar meu duro canto
desta obrigação sua, enquanto a morte
me não entrega ao duro Radamanto,
se para tristes há tão leda sorte.

 

 


 
   
E
 
 
 
 
Luís de  Camões
 

Com o Tempo o Prado Seco Reverdece
 
 

Com o tempo o prado seco reverdece, 
Com o tempo cai a folha ao bosque umbroso, 
 Com o tempo para o rio caudaloso, 
 Com o tempo o campo pobre se enriquece,

 

Com o tempo um louro morre, outro floresce, 
 Com o tempo um é sereno, outro invernoso, 
 Com o tempo foge o mal duro e penoso, 
 Com o tempo torna o bem já quando esquece,

 

Com o tempo faz mudança a sorte avara, 
 Com o tempo se aniquila um grande estado, 
 Com o tempo torna a ser mais eminente. 

 

Com o tempo tudo anda, e tudo pára, 
 Mas só aquele tempo que é passado 
 Com o tempo se não faz tempo presente. 


Respuesta  Mensaje 5 de 14 en el tema 
De: LOVE GIRL Enviado: 01/12/2009 10:26

 

 

VI

Camões

Canção

 

Com força desusada

aquenta o fogo eterno

üa ilha lá nas partes do Oriente,

de estranhos habitada,

aonde o duro Inverno

os campos reverdece alegremente.

A lusitana gente

por armas sanguinosas,

tem dela senhorio.

Cercada está dum rio

de marítimas águas saudosas;

das ervas que aqui nascem,

os gados juntamente e os olhos pascem.

Aqui minha ventura

quis que üa grã parte

da vida, que não tinha, se passasse,

para que a sepultura

nas mãos do fero Marte

de sangue e de lembranças matizasse.

Se Amor determinasse

que, a troco desta vida,

de mim qualquer memória

ficasse, como história

que de uns fermosos olhos fosse lida,

a vida e alegria

por tão doce memória trocaria.

 

Mas este fingimento,

por minha dura sorte,

com falsas esperanças me convida.

Não cuide o pensamento

que pode achar na morte

o que não pôde achar tão longa vida.

Está já tão perdida

a minha confiança

que, de desesperado

em ver meu triste estado,

também da morte perco a esperança.

Mas oh! que se algum dia

desesperar pudesse, viveria.

De quanto tenho visto

já gora não mespanto,

que até desesperar se me defende.

Outrem foi causa disto,

que eu nunca pude tanto

que causasse este fogo que me encende.

Se cuidam que me ofende

temor de esquecimento,

oxalá meu perigo

me fora tão amigo

que algum temor deixara ao pensamento!

Quem viu tamanho enleio

que houvesse ai esperança sem receio?

Quem tem que perder possa

se pode recear.

Mas triste quem não pode já perder!

Senhora, a culpa é vossa,

que para me matar

bastará ühora só de vos não ver.

Puseste-me em poder

de falsas esperanças;

e, do que mais me espanto:

que nunca vali tanto

que vivesse também com esquivanças.

Valia tão pequena

não pode merecer tão doce pena.

Houve-se Amor comigo

tão brando e pouco irado,

quanto agora em meus males se conhece;

que não há mor castigo

para quem tem errado q

ue negar-lhe o castigo que merece.

E bem como acontece

que assi como ao doente

da cura despedido,

o médico sabido

tudo quanto deseja lhe consente,

assi me consentia

esperança, desejo e ousadia.

E agora venho a dar

conta do bem passado

a esta triste vida e longa ausência.

 

Quem pode imaginar

que pode haver pecado

que mereça tão grave penitência?

Olhai que é consciência,

por tão pequeno erro,

Senhora, tanta pena!

Não vedes que é onzena?

Mas se tão longo e mísero desterro

vos dá contentamento,

nunca se acabe nele meu tormento.

Rio fermoso e claro,

e vós, ó arvoredos,

que os justos vencedores coroais,

e ao cultor avaro,

continuamente ledos,

dum tronco só diversos frutos dais;

assi nunca sintais

do tempo injúria algüa,

que em vós achem abrigo

as mágoas que aqui digo,

enquanto der o Sol virtude à Lüa;

porque de gente em gente

saibam que já não mata a vida ausente.

Canção, neste desterro viverás,

Voz nua e descoberta,

até que o tempo em Eco te converta.

 


 
   
 
 

V

Canção

 

Se este meu pensamento,

como é doce e suave,

de alma pudesse vir gritando fora,

mostrando seu tormento

cruel, e grave,

diante de vós só, minha Senhora:

pudera ser que agora

o vosso peito duro

tornara manso e brando.

E eu que sempre ando

 

pássaro solitário, humilde, escuro,

tornado um cisne puro,

brando e sonoro pelo ar voando,

com canto manifesto

pintara meu tormento e vosso gesto.

Pintara os olhos belos

que trazem nas mininas

o Minino que os seus neles cegou;

e os dourados cabelos

em tranças douro finas

a quem o Sol seus raios abaixou;

a testa que ordenou

atura tão formosa;

o bem proporcionado

nariz, lindo, afilado,

que a cada parte tem a fresca rosa;

a boca graciosa,

que querê-la louvar é escusado;

enfim, é um tesouro:

os dentes, perlas; as palavras, ouro.

Vira-se claramente,

ó Dama delicada,

que em vós se esmerou mais a Natureza;

e eu, de gente em gente,

trouxera trasladada

em meu tormento vossa gentileza.

Somente a aspereza

de vossa condição,

Senhora, não dissera,

porque se não soubera

que em vós podia haver algum senão.

E se alguém, com razão,

—Porque morres? dissera, respondera:

—Mouro porque é tão bela

que inda não sou para morrer por ela.

E se pola ventura,

Dama, vos ofendesse,

escrevendo de vós o que não sento,

e vossa fermosura

tão baixo não descesse

que a alcançasse um baixo entendimento,

seria o fundamento

daquilo que cantasse todo de puro amor,

porque vosso louvor

em figura de mágoas se mostrasse.

E onde se julgasse a causa pelo efeito,

minha dor diria ali sem medo:

quem me sentir, verá de quem procedo.

Então amostraria

os olhos saudosos,

o suspirar que a alma traz consigo;

a fingida alegria,

os passos vagarosos,

o falar, o esquecer-me do que digo;

um pelejar comigo,

e logo desculpar-me;

 

um recear, ousando;

andar meu bem buscando,

e de poder achá-lo acovardar-me;

enfim, averiguar-me

que o fim de tudo quanto estou falando

são lágrimas e amores;

são vossas isenções e minhas dores.

Mas quem terá, Senhora,

palavras com que iguale

com vossa fermosura minha pena;

que, em doce voz, de fora

aquela glória fale

que dentro na minhalma Amor ordena?

Não pode tão pequena

força de engenho humano

com carga tão pesada,

se não for ajudada

dum piedoso olhar, dum doce engano;

que, fazendo-me o dano

tão deleitoso, e a dor tão moderada,

que, enfim, se convertesse

nos gostos dos louvores que escrevesse.

Canção, não digas mais; e se teus versos

à pena vêm pequenos,

não queiram de ti mais, que dirás menos.

 

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Respuesta  Mensaje 6 de 14 en el tema 
De: LOVE GIRL Enviado: 01/12/2009 10:27
 
   


    

XIII

Elegia

 

O sulmonense Ovídio, desterrado

na aspereza do Ponto, imaginando

ver-se de seus parentes apartado;

sua cara mulher desamparando,

seus doces filhos, seu contentamento,

de sua pátria os olhos apartando;

não podendo encobrir o sentimento,

aos montes e às águas se queixava

de seu escuro e triste nacimento.

O curso das estrelas contemplava,

e como por sua ordem discorria

o céu, o ar e a terra adonde estava.

Os peixes pelo mar nadando via,

as feras pelo monte, procedendo

como seu natural lhes permitia.

De suas fontes via estar nascendo

os saudosos rios de cristal,

a sua natureza obedecendo.

Assi só, de seu próprio natural

apartado, se via em terra estranha,

a cuja triste dor não acha igual.

Só sua doce Musa o acompanha,

nos versas saudosos que escrevia,

e lágrimas com que ali o campo banha.

Destarte me afigura a fantasia a vida

com que vivo, desterrado do bem

que noutro tempo possuia.

Ali contemplo o gosto já passado,

que nunca passará pola memória

de quem o tem na mente debuxado.

Ali vejo a caduca e débil glória

desenganar meu erro, co a mudança

que faz a frágil vida transitória.

 

Ali me representa esta lembrança

quão pouca culpa tenho; e me entristece

ver sem razão a pena que me alcança.

Que a pena que com causa se padece,

a causa tira o sentimento dela;

mas muito dói a que se não merece.

Quando a roxa manhã, formosa

e bela, abre as portas ao sol, e cai o orvalho,

e torna a seus queixumes filomela;

este cuidado que co sono atalho

em sonhos me parece; que o que a gente

para descanso tem, me dá trabalho.

E despois de acordado, cegamente

(ou, por milhor dizer, desacordado,

que pouco acordo tem um descontente)

dali me vou com passo carregado,

a um outeiro erguido, e ali me assento,

soltando a rédea toda a meu cuidado.

Despois de farto já de meu tormento,

dali estendo os olhos saudosos

à parte aonde tenho o pensamento.

Não vejo senão montes pedregosos;

e os campos sem graça e secos vejo

que já floridos vira e graciosos.

Vejo o puro, suave e brando Tejo,

com as côncovas barcas, que, nadando,

vão pondo em doce efeito seu desejo.

as co brando vento navegando, o

utras cos leves remos, brandamente

as cristalinas águas apartando.

Dali falo co a água, que não sente

com cujo sentimento a alma sai

em lágrimas desfeita claramente.

Ó fugitivas ondas, esperai!

que, pois me não levais em companhia

ao menos estas lágrimas levai,

até que venha aquele alegre dia

que eu vá onde vós is, contente e ledo.

Mas tanto tempo quem o passaria?

Não pode tanto bem chegar tão cedo,

porque primeiro a vida acabará

que se acabe tão áspero degredo.

Mas esta triste morte que virá,

se em tão contrário estado me acabasse,

a alma impaciente adonde irá?

Que, se às portas tartáreas chegasse,

temo que tanto mal pola memória

nem ao passar de Lete lhe passasse.

Que, se a Tntalo e Tício for notória

a pena com que vai que a atormenta,

a pena que lá tem terão por glória.

Esta imaginação me acrescenta

mil mágoas no sentido, porque a vida

de imaginações tristes se sustenta.

Que, pois de todo vive consumido,

porque o mal que possui se resuma,

imagina na glória possuida,

até que a noite eterna me consuma,

ou veja aquele dia desejado,

em que Fortuna faça o que costuma;

 

—se nela há i mudar um triste estado.



 
   
 
 

 

 
 

VIII

Canção

 

Tomei a triste pena

já de desesperado

de vos lembrar as muitas que padeço,

com ver que me condena

a ficar eu culpado

o mal que me tratais e o que mereço.

Confesso que conheço

que, em parte, a causa dei

[a] o mal em que me vejo,

pois sempre meu desejo

a tão largas promessas entreguei;

mas não tive suspeita

que seguísseis tenção tão imperfeita.

Se em vosso esquecimento

tão envolto estou

como os sinais demonstram, que mostrais;

vivo neste tormento,

lembranças mais não dou

que as de razão tomar queirais:

olhai que me tratais

assi de dia em dia

com vossas esquivanças;

e as vossas esperanças,

de que, vãmente, eu me enriquecia,

renovam a memória;

pois com tê-la de vós, só tenho glória.

E se isto conhecêsseis

ser verdade pura

como ouro de Arábia reluzente,

inda que não quisésseis,

a condição tão dura

mudáreis noutra muito diferente.

E eu, como inocente

 

que estou neste caso,

isto em mãos pusera

de quem sentença dera

que ficasse o direito justo e raso,

se não arreceara

que a vós por mim, e a mim por vós matara.

Em vós escrita vi

vossa grande dureza,

e nalma escrita está que de vós vive;

não que acabasse ali

sua grande firmeza

o triste desengano que então tive;

porque antes que a dor prive

de todos meus sentidos,

ao grande tormento

acode o entendimento

com dous fortes soldados, guarnecidos

de rica pedraria,

que ficam sendo minha luz e guia.

Destes acompanhado,

estou posto sem medo

a tudo o que o fatal destino ordene;

pode ser que, cansado,

ou seja tarde, ou cedo,

com pena de penar-me, me despene.

E quando me condene

(que isto é o que espero)

inda a maiores dores,

perdidos os temores,

por mais que venha, não direi: não quero.

Contudo estou tão forte

que nem me mudará a mesma morte.

Canção, se já não queres

ver tanta crueldade,

lá vás onde verás minha verdade.


Respuesta  Mensaje 7 de 14 en el tema 
De: LOVE GIRL Enviado: 01/12/2009 10:28

 
   
 

 
    
   
 

CANçõES E ELEGIAS


Luís de Camões

 

I

Canção

 

Fermosa e gentil Dama, quando vejo

a testa de ouro e neve, o lindo aspeito,

a boca graciosa, o riso honesto,

o colo de cristal, o branco peito,

de meu não quero mais que meu desejo,

nem mais de vós que ver tão lindo gesto.

Ali me manifesto

por vosso a Deus e ao mundo; ali me inflamo

nas lágrimas que choro,

e de mim, que vos amo,

em ver que soube amar-vos, me namoro;

e fico por mim só perdido, de arte

que hei ciúmes de mim por vossa parte.

Se porventura vivo descontente

por fraqueza desprito, padecendo

a doce pena que entender não sei,

fujo de mim e acolho-me, correndo,

à vossa vista; e fico tão contente

que zombo dos tormentos que passei.

De quem me queixarei

se vós me dais a vida deste jeito

nos males que padeço,

senão de meu sujeito,

 

que não cabe com bem de tanto preço?

Mas inda isso de mim cuidar não posso,

de estar muito soberbo com ser vosso.

Se, por algum acerto, Amor vos erra

por parte do desejo, cometendo

algum nefando e torpe desatino,

se ainda mais que ver, enfim, pretendo,

fraquezas são do corpo, que é de terra,

mas não do pensamento, que é divino.

Se tão alto imagino que de vista

me perco (peco nisto),

desculpa-me o que vejo;

que se, enfim, resisto

contra tão atrevido e vão desejo,

faço-me forte em vossa vista pura,

e armo-me de vossa fermosura.

Das delicadas sobrancelhas pretas

os arcos com que fere, Amor tomou,

e fez a linda corda dos cabelos;

e porque de vós tudo lhe quadrou,

dos raios desses olhos fez as setas

com que fere quem alça os seus, a vê-los.

Olhos que são tão belos

dão armas de vantagem ao Amor,

com que as almas destrui;

porém, se é grande a dor,

co a alteza do mal a restitui;

e as armas com que mata são de sorte

que ainda lhe ficais devendo a morte.

Lágrimas e suspiros, pensamentos,

quem deles se queixar, fermosa Dama,

mimoso está do mal que por vós sente.

Que maior bem deseja quem vos ama

que estar desabafando seus tormentos,

chorando, imaginando docomente?

Quem vive descontente,

não há-de dar alívio a seu desgosto,

porque se lhe agradeça;

mas com alegre rosto

sofra seus males, para que os mereça;

que quem do mal se queixa, que padece,

fá-lo porque esta glória não conhece.

De modo que, se cai o pensamento

em algüa fraqueza, de contente,

é porque este segredo não conheço;

assi que com razões, não tão somente

desculpo ao Amor do meu tormento,

mas ainda a culpa sua lhe agradeço.

Por esta fé mereço

a graça, que esses olhos acompanha,

o bem do doce riso;

mas, porém, não se ganha

cum paraíso outro paraíso.

E assi, de enleada, a esperança

se satisfaz co bem que não alcança.

 

Se com razões escuso meu remédio,

sabe, Canção, que porque não vejo,

engano com palavras o desejo.

 


Respuesta  Mensaje 8 de 14 en el tema 
De: LOVE GIRL Enviado: 01/12/2009 10:29
 
 

 

  Sete anos de pastor

Sete anos de pastor Jacob servia
Labão, pai de Raquel, serrana bela;
mas não servia o pai, servia a ela,
e a ela só por prémio pretendia.

Os dias, na esperança de um só dia,
passava, contentando-se com vê-la;
porém o pai, usando de cautela,
em lugar de Raquel lhe dava Lia.

Vendo o triste pastor que com enganos
lhe fora assi negada a sua pastora,
como se não a tivera merecida,

Começa de servir outros sete anos,
dizendo: Mais servira, se não fora
pera tão longo amor tão curta a vida!

(Luís de Camões)

 


 
   
 
 
 
Luís Vaz de Camões
 

Pede o desejo, Dama, que vos veja
 
  

Pede o desejo, Dama, que vos veja.
Não entende o que pede; está enganado.
É este amor tão fino e tão delgado,
Que quem o tem não sabe o que deseja.

 

Não há cousa a qual natural seja
Que não queira perpétuo o seu estado.
Não quer logo o desejo o desejado,
Por que não falte nunca onde sobeja.

 

Mas este puro afeito em mim se dana;
Que, como a grave pedra tem por arte
O centro desejar da Natureza,

 

Assi o pensamento, pela parte
Que vai tomar de mim, terrestre, humana,
Foi, Senhora, pedir esta baixeza.

 


 
   
 
 

 

 
 
Luís de  Camões
 

Com o Tempo o Prado Seco Reverdece
 
 

Com o tempo o prado seco reverdece, 
Com o tempo cai a folha ao bosque umbroso, 
 Com o tempo para o rio caudaloso, 
 Com o tempo o campo pobre se enriquece,

 

Com o tempo um louro morre, outro floresce, 
 Com o tempo um é sereno, outro invernoso, 
 Com o tempo foge o mal duro e penoso, 
 Com o tempo torna o bem já quando esquece,

 

Com o tempo faz mudança a sorte avara, 
 Com o tempo se aniquila um grande estado, 
 Com o tempo torna a ser mais eminente. 

 

Com o tempo tudo anda, e tudo pára, 
 Mas só aquele tempo que é passado 
 Com o tempo se não faz tempo presente. 


 
   
 
 

 

Glosa a mote
(Acróstico)

A uma dama que se chamava Ana

 

A morte, pois que sou vosso,
Não a quero; mas se vem,
(H) A-de ser todo meu bem
.

Amor, que em meu pensamento
Com tanta fé se fundou,
Me tem dado um regimento
Que, quando vir meu tormento,
Me salve com cujo sou.
E com esta defensão,
Com que tudo vencer posso,
Diz a causa ao coração:
Não tem em mim jurdição
A morte, pois que sou vosso.

Por exprimentar um dia
Amor, se me achava forte
Nesta fé, como dizia,
Me convidou com a morte,
Só por ver se a tomaria.
E, como ela seja a cousa
Onde está todo o meu bem,
Respondi-lhe, como quem
Quer dizer mais, e não ousa:
Não a quero, mas se vem...

Não disse mais, porque então
Entendeu quanto me toca;
E se tinha dito o não,
Muitas vezes diz a boca
O que nega o coração.
Toda a cousa defendida
Em mais estima se tem.
Por isso é cousa sabida
Que perder por vós a vida
Há-de ser todo meu bem.


Respuesta  Mensaje 9 de 14 en el tema 
De: LOVE GIRL Enviado: 01/12/2009 10:30
 
 
 
 
Luís Vaz de Camões

Eu cantarei de amor tão docemente
 
 
 
Eu cantarei de amor tão docemente, 
Por uns têrmos em si tão concertados, 
Que dois mil acidentes namorados 
Faça sentir ao peito que não sente. 

Farei que amor a todos avivente, 
Pintando mil segredos delicados, 
Brandas iras, suspiros magoados, 
Temerosa ousadia e pena ausente. 

Também, Senhora, do desprêzo honesto 
De vossa vista branda e rigorosa, 
Contentar-me-ei dizendo a menor parte. 

Porém, para cantar de vosso gesto 
A composição alta e milagrosa, 
Aqui falta saber, engenho e arte.

 

 
   

 
  

  
   
 

CANçõES E ELEGIAS


Luís de Camões

 

I

Canção

 

Fermosa e gentil Dama, quando vejo

a testa de ouro e neve, o lindo aspeito,

a boca graciosa, o riso honesto,

o colo de cristal, o branco peito,

de meu não quero mais que meu desejo,

nem mais de vós que ver tão lindo gesto.

Ali me manifesto

por vosso a Deus e ao mundo; ali me inflamo

nas lágrimas que choro,

e de mim, que vos amo,

em ver que soube amar-vos, me namoro;

e fico por mim só perdido, de arte

que hei ciúmes de mim por vossa parte.

Se porventura vivo descontente

por fraqueza desprito, padecendo

a doce pena que entender não sei,

fujo de mim e acolho-me, correndo,

à vossa vista; e fico tão contente

que zombo dos tormentos que passei.

De quem me queixarei

se vós me dais a vida deste jeito

nos males que padeço,

senão de meu sujeito,

 

que não cabe com bem de tanto preço?

Mas inda isso de mim cuidar não posso,

de estar muito soberbo com ser vosso.

Se, por algum acerto, Amor vos erra

por parte do desejo, cometendo

algum nefando e torpe desatino,

se ainda mais que ver, enfim, pretendo,

fraquezas são do corpo, que é de terra,

mas não do pensamento, que é divino.

Se tão alto imagino que de vista

me perco (peco nisto),

desculpa-me o que vejo;

que se, enfim, resisto

contra tão atrevido e vão desejo,

faço-me forte em vossa vista pura,

e armo-me de vossa fermosura.

Das delicadas sobrancelhas pretas

os arcos com que fere, Amor tomou,

e fez a linda corda dos cabelos;

e porque de vós tudo lhe quadrou,

dos raios desses olhos fez as setas

com que fere quem alça os seus, a vê-los.

Olhos que são tão belos

dão armas de vantagem ao Amor,

com que as almas destrui;

porém, se é grande a dor,

co a alteza do mal a restitui;

e as armas com que mata são de sorte

que ainda lhe ficais devendo a morte.

Lágrimas e suspiros, pensamentos,

quem deles se queixar, fermosa Dama,

mimoso está do mal que por vós sente.

Que maior bem deseja quem vos ama

que estar desabafando seus tormentos,

chorando, imaginando docomente?

Quem vive descontente,

não há-de dar alívio a seu desgosto,

porque se lhe agradeça;

mas com alegre rosto

sofra seus males, para que os mereça;

que quem do mal se queixa, que padece,

fá-lo porque esta glória não conhece.

De modo que, se cai o pensamento

em algüa fraqueza, de contente,

é porque este segredo não conheço;

assi que com razões, não tão somente

desculpo ao Amor do meu tormento,

mas ainda a culpa sua lhe agradeço.

Por esta fé mereço

a graça, que esses olhos acompanha,

o bem do doce riso;

mas, porém, não se ganha

cum paraíso outro paraíso.

E assi, de enleada, a esperança

se satisfaz co bem que não alcança.

 

Se com razões escuso meu remédio,

sabe, Canção, que porque não vejo,

engano com palavras o desejo.

 


 
   
 

 
Luís Vaz de Camões
 

Busque Amor novas artes, novo engenho
 

 

Busque Amor novas artes, novo engenho, 
para matar-me, e novas esquivanças; 
que não pode tirar-me as esperanças, 
que mal me tirará o que eu não tenho. 

 

Olhai de que esperanças me mantenho! 
Vede que perigosas seguranças! 
Que não temo contrastes nem mudanças, 
andando em bravo mar, perdido o lenho. 

 

Mas, conquanto não pode haver desgosto 
onde esperança falta, lá me esconde 
Amor um mal, que mata e não se vê. 

 

Que dias há que nalma me tem posto 
um não sei quê, que nasce não sei onde, 
vem não sei como, e dói não sei porquê. 


Respuesta  Mensaje 10 de 14 en el tema 
De: LOVE GIRL Enviado: 01/12/2009 10:31
 
 
 

Luís Vaz de Camões

Quem vê, Senhora, claro e manifesto
 
 
 
Quem vê, Senhora, claro e manifesto
O lindo ser de vossos olhos belos,
Se não perder a vista só com vê-los,
Já não paga o que deve a vosso gesto.

Este me parecia preço honesto;
Mas eu, por de vantagem merecê-los,
Dei mais a vida e a alma por querê-los,
Donde já me não fica mais de resto.

Assim que a vida e alma e esperança,
E tudo quanto tenho, tudo é vosso,
E o proveito disso eu só o levo.

Porque é tamanha bem-aventurança
O dar-vos quanto tenho e quanto posso,
Que quanto mais vos pago, mais vos devo.
 

                                                                                    

 

 


Respuesta  Mensaje 11 de 14 en el tema 
De: LOVE GIRL Enviado: 01/12/2009 10:31
 

 
Verdes são os campos
(Luís Vaz de Camões)
 
Verdes são os campos,
De cor de limão:
Assim são os olhos
Do meu coração.

Campo, que te estendes
Com verdura bela;
Ovelhas, que nela
Vosso pasto tendes,

De ervas vos mantendes
Que traz o Verão,
E eu das lembranças
Do meu coração.

Gados que pasceis
Com contentamento,
Vosso mantimento
Não no entendereis;

Isso que comeis
Não são ervas, não:
São graças dos olhos
Do meu coração.
 
 

 
   
 
 
 

 

NUM JARDIM ...

 

Num jardim adornado de verdura,
a que esmaltam por cima várias flores,
entrou um dia a deusa dos amores,
com a deusa da caça e da espessura.

Diana tomou logo üa rosa pura,
Vénus um roxo lírio, dos milhores;
mas excediam muito às outras flores
as violas, na graça e fermosura.

Perguntam a Cupido, que ali estava,
qual daquelas três flores tomaria,
por mais suave, pura e mais fermosa?

Sorrindo se, o Minino lhe tornava:
todas fermosas são, mas eu queria
V i o l a n t e s que lírio, nem que rosa.

Luis de Camões  

 


 
   
 
 
 

 

 

FERMOSA E GENTIL DAMA

 

Fermosa e gentil Dama, quando vejo
A testa de ouro e neve, o lindo aspeito,
A boca graciosa, o riso honesto,
O colo de cristal, o branco peito,
De meu não quero mais que meu desejo,
Nem mais de vós que ver tão lindo gesto.
Ali me manifesto
Por vosso a Deus e ao mundo; ali me inflamo
Nas lágrimas que choro,
E de mim, que vos amo,
Em ver que soube amar-vos, me namoro;
E fico por mim só perdido, de arte
Que hei ciúmes de mim por vossa parte.

Se porventura vivo descontente
Por fraqueza de espírito, padecendo
A doce pena que entender não sei,
Fujo de mim e acolho-me, correndo,
à vossa vista; e fico tão contente,
Que zombo dos tormentos que passei.
De quem me queixarei,
Se vós me dais a vida deste jeito
Nos males que padeço,
Senão de meu sujeito,
Que não cabe com bem de tanto preço?
Mas inda isso de mim cuidar não posso,
De estar muito soberbo com ser vosso.

Se, por algum acerto Amor vos erra
Por parte do desejo, cometendo
Algum nefando e torpe desatino,
Se ainda mais que ver, enfim, pretendo,
Fraquezas são do corpo, que é da terra,
Mas não do pensamento, que é divino,
Se tão alto imagino
Que de vista me perco, ou peco nisto,
Desculpa-me o que vejo;
Que, se, enfim, resisto
Contra tão atrevido e vão desejo,
Faço-me forte em vossa vista pura,
E armo-me de vossa fermosura.

Das delicadas sobrancelhas pretas
Os arcos com que fere, Amor tomou,
E fez a linda corda dos cabelos;
E porque de vós tudo lhe quadrou,
Dos raios desses olhos fez as setas
Com que fere quem alça os seus a vê-los.
Olhos que são tão belos,
Dão armas de vantagem ao Amor,
Com que as almas destrui;
Porém, se é grande a dor,
Coa alteza do mal a restitui;(1)
E as armas com que mata são de sorte
Que ainda lhe ficais devendo a morte.

Lágrimas e suspiros, pensamentos,
Quem deles se queixar, fermosa Dama,
Mimoso está do mal que por vós sente.
Que maior bem deseja quem vos ama
Que estar desabafando seus tormentos,
Chorando, imaginando docomente?
Quem vive descontente,
Não há-de dar alívio a seu desgosto,
Porque se lhe agradeça;
Mas com alegre rosto
Sofra seus males, pera que os mereça;
Que, quem do mal se queixa que padece,
Fá-lo, porque esta glória não conhece.

De modo que, se cai o pensamento
Em algũa fraqueza, de contente,
É porque este segredo não conheço;
Assim que com razões, não tão somente
Desculpo ao Amor do meu tormento,
Mas ainda a culpa sua lhe agradeço.
Por esta fé mereço
A graça que esses olhos acompanha,
O bem do doce riso;
Mas, porém, não se ganha
Cum paraíso outro paraíso.
E assi, de enleada, a esperança
Se satisfaz coo bem que não alcança.

Se com razões escuso meu remédio,
Sabe, Canção, que, porque não vejo,
Engano com palavras o desejo.

 

(1) Terá o Poeta escrito as restitui, referindo-se às almas que o Amor destrui? Se o pronome a se refere a dor, restitui tem o sentido de cura (a dor).

 

Hernni Cidade, Luís de Camões - Lírica, Círculo de Leitores, Lisboa, 1973


 
   

Monet - Dama con ombrellino, cm 60x80

Quando me quer enganar ...

 

Quando me quer enganar

A minha bela perjura,

Para mais me confirmar

O que quer certificar,

Pelos seus olhos mo jura.

 

Como meu contentamento

Todo se rege por eles,

Imagina o pensamento

Que se faz agravo a eles

Não crer tão grão juramento.

 

Porém, como em casos tais

Ando já visto e corrente,

Sem outros certos sinais,

Quanto me ela jura mais,

Tanto mais cuido que mente.

 

Então, vendo-lhe ofender

Uns tais olhos como aqueles,

Deixo-me antes tudo crer,

Só pela não constranger

A jurar falso por eles.

 

Luís  de  Camões


Respuesta  Mensaje 12 de 14 en el tema 
De: LIFE Enviado: 20/12/2009 11:14


SONETO - 1 -

Enquanto quis Fortuna que tivesse
esperança de algum contentamento,
o gosto de um suave pensamento
me fez que seus efeitos escrevesse.

Porém, temendo Amor que aviso desse
minha escritura a algum juízo isento,
escureceu-me o engenho co tormento,
para que seus enganos não dissesse.

Ó vós que Amor obriga a ser sujeitos
a diversas vontades! Quando lerdes
num breve livro casos tão diversos,

verdades puras são, e não defeitos...
E sabei que, segundo o amor tiverdes,
tereis o entendimento de meus versos!

Luis de Camões

Respuesta  Mensaje 13 de 14 en el tema 
De: QUIM TROVADOR Enviado: 20/12/2009 13:51


Busque Amor novas artes, novo engenho,
para matar me, e novas esquivanças;
que não pode tirar me as esperanças,
que mal me tirará o que eu não tenho.

Olhai de que esperanças me mantenho!
Vede que perigosas seguranças!
Que não temo contrastes nem mudanças,
andando em bravo mar, perdido o lenho.

Mas, conquanto não pode haver desgosto
onde esperança falta, lá me esconde
Amor um mal, que mata e não se vê.

Que dias há que n'alma me tem posto
um não sei quê, que nasce não sei onde,
vem não sei como, e dói não sei porquê.

Luis de Camões

Respuesta  Mensaje 14 de 14 en el tema 
De: QUIM TROVADOR Enviado: 20/12/2009 13:57



SONETO - 4 -

Tanto de meu estado me acho incerto,
que em vivo ardor tremendo estou de frio;
sem causa, juntamente choro e rio,
o mundo todo abarco e nada aperto.

É tudo quanto sinto, um desconcerto;
da alma um fogo me sai, da vista um rio;
agora espero, agora desconfio,
agora desvario, agora acerto.

Estando em terra, chego ao Céu voando,
num'hora acho mil anos, e é de jeito
que em mil anos não posso achar ü'hora.

Se me pergunta alguém porque assi ando,
respondo que não sei; porém suspeito
que só porque vos vi, minha Senhora.

Luis de Camões


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